Fernando Garrido: Subida dos preços na hotelaria “resulta da lei da oferta e da procura”
Na segunda parte da entrevista com o presidente da Associação dos Diretores de Hotéis de Portugal, Fernando Garrido, falámos das preocupações para além da falta de profissionais, do processo de constituição da Ordem dos Diretores de Hotéis, dos preços da hotelaria e do mercado nacional. A atividade de formação da ADHP e os 50 anos da Associação também estiveram “em cima da mesa”.
Nem todos os problemas na hotelaria passam pelos recursos humanos, por isso perguntava-lhe qual é hoje a maior preocupação na gestão das unidades hoteleiras?
A maior preocupação é retornar ao cliente o valor pago pela estadia, ou seja, dar ao cliente a qualidade expectável face àquilo que paga. Temos que garantir que o cliente entra satisfeito e sai muitíssimo satisfeito e essa é uma preocupação que se prende com a falta de recursos humanos qualificados. Nesta perspetiva, a nossa Associação tem diversificado a sua formação que estava muito focada na especialização em direção e neste momento estamos a apostar numa formação muito mais específica de quadros médios para ajudar o setor e ajudar a profissão.
Uma das grandes questões que se colocou o ano passado foi a inflação. Este ano, as coisas estão mais fáceis?
O problema está mais atenuado, embora não ultrapassado até porque os próprios colaboradores sentem isso a título pessoal, mas os números não mentem e estamos a ter um ano excecional. O ano passado, os aumentos impactaram fortemente as nossas margens mas este ano estamos a sentir algum abrandamento da pressão. Não estou a dizer que há descidas de preços, o que digo é que o aumento não está a ser tão acentuado e estamos também a sentir um pequeníssimo decréscimo nos custos da energia.
Posto isto, este ano está a ser muito positivo, no primeiro quadrimestre os proveitos aumentaram cerca de 40% face a 2019 e no RevPAR estamos a subir 32%. Meses como o de março, foram fenomenais nas grandes cidades e temos uma expectativa elevada para o verão embora continuemos com alguns receios dos efeitos que as subidas das taxas de juro e os preços dos produtos possam ter sobre a bolsa dos consumidores. Por isso somos cautelosos nas nossas expectativas, apesar de pensarmos que este possa ser o melhor ano de sempre.
Voltou a ser tema de conversa entre o cidadão comum que os hoteleiros estão de novo a querer afastar os hóspedes portugueses devido aos preços que estão a praticar. Este tipo de crítica tem alguma razão de ser?
De todo, aliás o mercado interno continua a ter um peso muito considerável ao nível do número de hóspedes nas nossas unidades hoteleiras, sendo que até abril os portugueses representaram cerca de 43% do total de hóspedes no alojamento turístico, embora a representatividade seja um pouco inferior quando falamos de dormidas. Os preços resultam da lei da oferta e da procura, ou seja, quando há uma maior procura o preço aumenta.
O que eu acho é que o cliente português começa também a perceber o mercado de outra forma, dando-se conta de que se reservar com maior antecedência consegue melhores preços e isso tem vindo a acontecer, só que quando chegamos às épocas de pico tudo fica mais difícil mas não é uma questão de não querer portugueses, é apenas uma questão de procura.
Na hotelaria sempre valorizámos muito o cliente nacional, há muitas empresas que fazem campanhas direcionadas exclusivamente ao mercado nacional e, para além disso, os hoteleiros não esquecem que foi o cliente nacional que, de alguma forma minimiou os efeitos da pandemia. Nós, enquanto diretores de hotel, temos que rentabilizar ao máximo as empresas para as quais trabalhamos.
“O nosso objetivo não é que um hotel contrate uma pessoa da Associação, o que queremos é que um diretor de hotel tenha formação contínua. Se o proprietário do hotel não quiser um diretor de hotel, pode contratar um gestor mas ele não será um diretor de hotel”
O Fernando Garrido já fazia parte da anterior direção e a dada atura a ADHP começou a falar muito na possibilidade de constituição de uma Ordem para um melhor reconhecimento da profissão. Como é que estão as coisas?
A nova Lei das Ordens foi publicada em fins de março, neste momento ela está a ser analisada pelo nosso gabinete de advogados e estamos a trabalhar nesse sentido e a tentar perceber como é que nos adaptamos.
A Ordem é um dos objetivos mas nós estamos a fazer um caminho desde há bastante tempo, estivemos a fazer uma primeira leitura da Lei e pensamos que ela vai um pouco ao encontro daquilo que nos falamos há uns anos: uma Ordem, se não estiver ligada ao futuro da profissão, que e a formação, não serve para nada. No entanto, continuamos a reservar-nos um pouco porque a Lei esta ainda a ser analisada e ainda não a conhecemos em detalhe.
Nós temos uma certificação em que reconhecemos os nossos Associados, tanto ao nível de formação como ao nível de experiência e os nossos estatutos preveem que para ser associado da ADHP os candidatos têm que ter experiência profissional e/ou um curso superior de gestão hoteleira.
Esta insistência no reconhecimento das profissões e a questão das categorias profissionais estarem um pouco associadas à formação, vai um pouco nesse sentido de caminharmos para uma Ordem. Se nós conseguirmos ir dando estes passos, a Ordem será apenas o finalizar do processo.
O nosso objetivo não é que um hotel contrate uma pessoa da Associação, o que queremos é que um diretor de hotel tenha formação contínua. Se o proprietário do hotel não quiser um diretor de hotel, pode contratar um gestor mas ele não será um diretor de hotel. A União Europeia pensa de outra forma que passa pela autorregulação dos mercados, não estamos contra mas achamos que tem que haver um mínimo de exigência porque o nosso grande objetivo é o de prestarmos o melhor serviço ao cliente final, até porque o turismo é e será sempre um dos principais ‘assets’ do país.
Normalmente, o verão traz consigo um desacelerar da atividade associativa. Neste sentido o que é que a ADHP pretende concretizar até ao próximo congresso?
Estamos a preparar a comemoração dos nossos 50 anos, que vai ocorrer no último trimestre do ano mas o verão também nos permite parar para repensar a nossa estratégia no sentido de melhorar o alcance dos nossos objetivos.
A nossa grande aposta vai ser na formação, nomeadamente no sentido de formar os profissionais. Sendo a Academia da ADHP certificada, podemos certificar algumas áreas da hotelaria e é aí que vamos apostar.
A ideia é a formação no local de trabalho?
Sim, ou em alternativa podemos também trabalhá-la online. A formação on the job pode ser uma solução no caso de as empresas assim o entenderem e, nesse caso, poderá ser muito mais uma formação on request, quando falamos numa formação global estamos a falar da formação online em que temos tido excelentes resultados. Vamos dar uma atenção especial às ilhas, onde estamos muito bem representados, apostando na especificidade das ilhas e permitindo fazer uma formação conjunta e podemos desenhar programas de formação específicos para empresas e entidades públicas ou privadas, com a garantia de um selo ADHP, porque é uma formação dada principalmente por profissionais.
ADHP tem mudado a forma de comunicar com os associados e com o trade
Têm sido muito ativos nas redes sociais onde até dão as boas vindas aos novos associados. Gostava de saber se têm crescido em número em número de associados e se sabem quanto é que ainda podem crescer?
Não tenho números concretos mas sei que temos tido uma ótima aceitação de todo o mercado e que temos crescido significativamente em número de associados, tanto em novos associados como no regresso de alguns que tinham saído, o que é muito importante. Quanto ao crescimento futuro, não me preocupa muito que quota de crescimento ainda podemos ter, o que a nossa direção quer é sentir que estamos a fazer um bom trabalho. Trabalhamos para os associados e para o setor e se houver um crescimento isso significa que estamos a fazer um bom trabalho.
As redes sociais têm sido bastante importantes, aliás costumo dizer que pouco mudou da direção do Raúl Ribeiro Ferreira para a minha, aliás eu era vice-presidente dele. O que mudou foi a forma como começámos a comunicar e a visibilidade que temos vem dessa nova forma de comunicar, utilizando bastante as redes sociais. Isto refere-se não apenas aos associados mas também aos parceiros, sentimos que esta maior visibilidade que temos nas redes sociais levou a uma maior aceitação das nossas propostas por parte dos nossos parceiros, nomeadamente no nosso congresso.
Leia aqui a 1ª parte da entrevista com Fernando Garrido, presidente da Associação dos Diretores de Hotéis de Portugal.