“A cidade de Lisboa, neste momento, não consegue viver sem turismo”, considera Diogo Laranjo
![](https://turisver.pt/wp-content/uploads/2024/06/Diogo-Laranjo_2.jpg)
Na segunda parte da entrevista a Diogo Laranjo, general manager dos Hotéis Heritage Lisboa, falámos sobre o aumento do turismo em Lisboa e das “dores” que lhe estão associadas, da necessidade de descentralizar os polos turísticos, das taxas turísticas, da importância de investir em novos equipamentos e do impacto dos grandes eventos.
O turismo em Lisboa tem mudado, tem evoluído e tem cativado cada vez mais turistas. Na sua opinião, Lisboa, como cidade, e em outros aspetos colaterais ao turismo, fazemos turistas sofrer um bocadinho?
Aspeto número um, o aeroporto. Este é já um assunto que vem de há muitos anos e é algo que nos preocupa muito, diria esmo que é a nossa principal preocupação. Existem outros problemas que surgem pelo crescimento de uma cidade que tem muitos turistas, como é o caso da limpeza, que é algo para que as entidades têm que olhar, e que também nos preocupa.
Algo que também nos começa a preocupar e que já é notícia é a questão dos sem-abrigo, que está associada à própria limpeza e à segurança, naturalmente. Seria importante que as entidades olhassem bem para a cidade e que estagnassem os problemas. Não quero ser pessimista, porque, de facto, não é o nosso lema em termos de empresa., mas é algo que nos preocupa bastante.
Há muita gente que diz que há turistas a mais em Lisboa. Na sua perspetiva, Lisboa já está nos seus limites quando comparada com outras cidades europeias? Já temos um problema de overtourism?
Se compararmos com outras cidades europeias, se compararmos com Veneza por exemplo, o excesso de turismo não é de todo um problema. É claro que se percebe que existem alguns locais da cidade um pouco saturados porque o turismo está muito centralizado, há um triângulo em que os turistas se concentram e acho que se poderiam criar algumas situações de atrair o turista para outras áreas. A única área que foge um bocadinho daqui do centro histórico é a zona do Belém, onde as pessoas acabam por ir ao Mosteiro dos Jerónimos, à Torre do Belém, e não fogem muito daí.
Depois o centro histórico acaba por ser o Castelo de São Jorge, a zona da Baixa, que está um bocadinho saturada. Basta circular na cidade para sentir isso e é uma coisa que eu faço quase diariamente, porque sendo responsável por todo o grupo, tenho que me deslocar a unidades como as Janelas Verdes ou o Solar do Castelo e ir ao Castelo de São Jorge é uma loucura, é de longe o monumento mais visitado no país, e portanto, está saturado.
A cidade de Lisboa, neste momento, não consegue viver sem turismo e eu não diria que está saturada, há é alguns locais de grande concentração turística, e por isso seria importante criar outras zonas de atração ou descentralizar um pouco, para que o turista circulasse para além do chamado centro histórico.
“Um parque de diversões como era a Feira Popular, não na localização onde estava, seria uma ajuda. Um centro de congressos, assunto tão falado desde há décadas, seria algo que ajudaria a todos e que impactaria muito na cidade, na região e na sua hotelaria”
Há quem diga que haver uma Feira Popular com características mais modernas ou um parque diferenciado com animação, seria uma opção interessante se ele fosse distante do centro da cidade. Seria assim tão importante?
A questão do parque de diversões, como a do centro de congressos de Lisboa, era algo que teria um impacto muitíssimo grande para a cidade. Todos esses equipamentos seriam positivos para a cidade como oferta diferenciada daquela que temos. Veja-se o impacto que teve, por exemplo, o Oceanário, que é um dos equipamentos mais visitados na cidade.
Claramente, um parque de diversões como era a Feira Popular, não na localização onde estava, seria uma ajuda. Um centro de congressos, assunto tão falado desde há décadas, seria algo que ajudaria a todos e que impactaria muito na cidade, na região e na sua hotelaria – provavelmente impactaria menos nos hotéis Heritage do que em unidades de maiores dimensões.
Os grandes eventos, da dimensão, por exemplo, da Jornada Mundial da Juventude, fazem falta à cidade?
Lisboa, para a sua dimensão, tem tido alguns eventos marcantes, caso do Europeu de Futebol e das JMJ que embora não tivesse tido um grande impacto na hotelaria teve impactos a outros níveis, nomeadamente na restauração, no comércio e na própria imagem da cidade porque falou-se muito de Lisboa. E, dentro de poucos anos, vamos ter o Mundial de Futebol que vai ter também um grande impacto.
Depois, temos concertos importantes. Recentemente tivemos o fenómeno Taylor Swift que impactou na cidade. Muitas vezes não se dá muita importância a este tipo de eventos mas a verdade é que Lisboa estava com ocupações elevadíssimas, havia hotéis com reservas fechadas há meses. Isto além da repercussão que teve nos meios de comunicação internacionais. Todos esses eventos são bem vindos e são importantes.
O mesmo se passa com os grandes congressos de medicina, por exemplo, e com a Web Summit que até se realiza numa altura de época baixa e que impacta muito na cidade e na ocupação hoteleira.
Falou-se muito de Lisboa ser uma “mola” para que os turistas pudessem sair fora do concelho, o que poderia fazer aumentar a estada média, mas parece que essa estratégia nunca se conseguiu implementar. Acha que as várias entidades deveriam falar entre si e procurar criar programação que abrangesse outros concelhos à volta de Lisboa?
Acho que sim. O polo Cascais-Estoril, continua a ser um destino com maior sazonalidade do que a cidade de Lisboa, mas há hóspedes que acabam por ficar em Lisboa e vão passear a Cascais e ao Estoril, vão a Sintra passar um dia. O facto de estarem em Lisboa acaba por facilitar, por exemplo, uma ida a Fátima, uma ida a Évora ou a Óbidos, alguns pernoitam nesses sítios mas muitos deles vão e vêm no mesmo dia. Neste caso, poderá, de facto, ser feito um trabalho com estes destinos para que haja mais turistas a diversificar a sua estadia, porque Portugal é um país relativamente pequeno.
“O pós-Expo foi um fenómeno porque a cidade de Lisboa nos meses de verão não tinha quase procura nenhuma e hoje em dia os meses de verão têm taxas de ocupação de tal forma elevadas que há meses de inverno um pouco mais fracos”
Dizia, na primeira parte da nossa entrevista que está há muitos anos nesta área. Há 15 anos, por exemplo, esperava que chegássemos a 2024 com estes números globais do país em termos de turismo, e com uma pandemia pelo meio?
Não, de todo. Penso que houve vários fatores que se conjugaram e houve um acontecimento em Lisboa, que mudaram um bocado o paradigma, nomeadamente nos meses de verão, que foi a Expo. O pós-Expo foi um fenómeno porque a cidade de Lisboa nos meses de verão não tinha quase procura nenhuma e hoje em dia os meses de verão, têm taxas de ocupação de tal forma elevadas que há meses de inverno um pouco mais fracos.
Lisboa tem um quinhão grande, mas o país está em cima dos 30 milhões de turistas…
Acho que fomos descobertos, mas também não podemos desvalorizar o trabalho que foi feito pelas várias entidades e que leva muitos anos a dar frutos. Claramente, o país mudou, e Lisboa em particular. O resto do país acaba a ser muito mais sazonal, e diria que tirando Lisboa, Porto e Madeira, são destinos muito menos sazonais – o Porto, então, é um fenómeno porque é muito mais recente – mas todos beneficiamos, em termos de país e em termos de destinos diferenciados, dessas mais valias. Há um melhoramento fantástico na zona centro do país, que era uma região que antigamente não era muito visitada. Por outro lado, hoje em dia temos em qualquer recanto, unidades hoteleiras fantásticas, de boa qualidade, e isso também potenciou imenso o crescimento do país e dos vários destinos.
Terminava a nossa entrevista com o tema da taxa turística. Sente que tem um impacto real no turista?
Nada nos move contra a taxa, antes pelo contrário, mas o que na altura da criação da taxa turística ficou programado era que o dinheiro proveniente, ou pelo menos uma quota-parte do dinheiro que vinha da taxa turística, seria investido para resolver alguns dos problemas que já apontei e para criar novos atrativos, para os turistas. Por exemplo, criou-se o Museu da Ajuda com a ajuda das verbas provenientes da taxa turística.
Já que o dinheiro vem da cobrança de uma taxa aos turistas, acho que era importante que fosse aplicada para benefício também dos turistas. Naturalmente pode ser com outras finalidades, mas tem que se perceber que as verbas resultantes das taxas turísticas não vai ser agora exclusivamente aproveitado para resolver lacunas de tesouraria que as Câmaras Municipais têm. Têm que ser aplicadas em prol do turismo, de alguma forma.