Vítor Silva: O “ataque” do Alentejo aos mercados internacionais, o orçamento e o Ministério do Turismo
Em entrevista ao Turisver, o presidente da Agência Regional de Promoção Turística do Alentejo, Vítor Silva, falou do caminho de retoma que a grande maioria dos mercados externos está a ter para a região, das recentes ações promocionais em que o Alentejo esteve envolvido e do orçamento para a promoção. Manifestou também a necessidade de o país ter um Ministério do Turismo.
No momento e que falamos está a terminar a feira de turismo de Madrid (FITUR) onde o Alentejo esteve amplamente representado, por isso começo por perguntar se Espanha continua a ser o principal mercado externo para o Alentejo?
É verdade, é um mercado que anda sempre em torno dos 20% e penso que este é um valor bom porque é robusto mas não é demasiado. Há regiões do país que dependem muito mais do mercado espanhol e quando um determinado mercado tem um peso excessivo é sempre mau porque se esse mercado falha, surgem os problemas.
Ainda não temos os números de dezembro do ano passado mas em novembro estávamos com uma quebra de 2% no mercado espanhol, o que é uma pequena quebra mas globalmente, nos mercados externos, ainda estávamos com uma quebra de 5,9% face a igual período de 2019. Esta baixa tem várias justificações, uma prende-se com o mercado chinês que já tinha alguma importância para a nossa região e que deixou de funcionar e com o mercado brasileiro que ainda está com problemas para todos os destinos.
No caso do Alentejo não há nenhum mercado que represente mais de metade daquilo que representa o mercado espanhol, os outros mercados bons representam cerca de 10%. É o caso da Alemanha que agora é o nosso segundo mercado externo.
Por isso vamos continuar a fazer o nosso trabalho em Espanha, porque se trata de um mercado que não é intermediado. Apostamos muito nas redes sociais e a única feira a que vamos é a FITUR. Em virtude do aprofundamento da colaboração entre a Entidade Regional e a Agência Regional de Promoção Turística já tivemos o ano passado, e vamos voltar a ter em 2023, um aumento de 50% no budget que temos para o mercado espanhol, o que é importante porque, na minha opinião, o mercado espanhol merece muita atenção.
Os mercados judaico e brasileiro para Portugal e para o Alentejo
Sei que proximamente vão voltar a fazer uma ação na feira de turismo de Israel…
Quem vai fazer uma ação é o Turismo de Portugal. Na minha opinião, que aliás tive a oportunidade de expressar ao Turismo de Portugal, nós temos que estar presentes na feira de Israel. Isto é um pouco como aconteceu com a ABAV, muitos criticavam e diziam que não tínhamos que estar na ABAV e eu dizia sempre que o Alentejo tinha que estar presente e que Portugal também devia de estar até por uma questão política – o turismo também tem esta componente política. É verdade que já quase não havia destinos europeus na ABAV mas se Portugal não estivesse presente isso tinha uma leitura política porque as relações entre Portugal e Brasil têm essa componente política e nós temos que ter essa responsabilidade.
No caso de Israel essa importância política não é tão grande mas se nós quisermos voltar-nos para o turismo judaico – essa foi uma decisão que o Turismo de Portugal tomou, e bem, há uns anos – temos que estar na feira. O mercado judaico ainda é pequeno mas pode crescer e, além disso, não podemos entender este mercado como Israel apenas porque há mais judeus, por exemplo nos Estados Unidos do que em Israel e a maior comunidade judaica da América do Sul está em São Paulo onde, aliás, nós fizemos ações específicas para esse mercado.
É verdade que não se trata de uma grande feira e também é verdade que não fazemos lá muito negócio mas não podemos dizer que apostamos no mercado judaico e não estarmos lá. Por isso sempre disse ao Turismo de Portugal que devíamos tentar fazer ações paralelas à feira. Nós tínhamos pensado fazer uma ação no âmbito da Euroregião, com o Centro de Portugal e a Extremadura espanhola onde o património judaico tem alguma importância, mas entretanto o Turismo de Portugal informou-nos que ia fazer uma ação naquele mercado e por isso não fazia sentido irmos para a frente com a nossa ideia. Ainda não tenho os contornos daquilo que vai ser feito pelo Turismo de Portugal mas sempre pensei que devíamos tentar, idealmente no dia anterior à feira, fazer uma ação com operadores turísticos.
Já veem alguns frutos desse mercado?
Não é fácil contabilizar porque os judeus que não vêm de Israel não são referenciados como israelitas – se vierem do Brasil entram nas contas do mercado brasileiro, se vierem dos EUA ou do Canadá são estadunidenses ou canadianos. Isto significa que temos mais turismo judaico no território do que aquele que é percetível. Por outro lado, se falarmos com o presidente da Câmara de Castelo de Vide, o que nos diz é que o turismo judaico é um êxito, e nós temos que atender às especificidades de alguns dos nossos territórios e o facto é que o turismo judaico é um excelente negócio para a zona de Castelo de Vide – Portalegre – Marvão.
O mercado de Israel, propriamente dito, tem que ser mais bem pensado, nós podemos contribuir para isso mas o Turismo de Portugal poderá fazê-lo porque tem pessoas muito competentes para isso.
Alentejo inicia o ano em feiras nos principais mercados emissores
O Alentejo esteve em três feiras seguidas, uma na Holanda, outra na Alemanha e na FITUR, em Espanha…
A Vakantiebeurs é uma feira muito boa, é a maior feira dos Países Baixos, incluindo também aqui a região flamenga da Bélgica, aliás o Alentejo trabalha esses mercados em conjunto – nós não temos belgas francófonos no território, são todos flamengos. É um mercado que sempre foi bom para o Alentejo, somamos os dois e os resultados que temos andam em torno dos 8% do total de turistas estrangeiros que temos na região, sendo mesmo o mercado que mais está a crescer.
A Vakantiebeurs é uma feira onde Portugal é muito reconhecido e o Alentejo também e foi uma feira que correu muito bem.
Depois estivemos na CMT em Estugarda, na Alemanha. Eu costumo dizer que a CMT não é uma feira mas sim “a feira”. A feira é só para o público, tem uma duração de nove dias e nunca tem menos de 250.000 visitantes. Eu estive lá três dias e foi uma loucura. O Turismo de Portugal não está presente mas Portugal tem um stand que foi um trabalho nosso, da ARPT do Alentejo, e este ano o Turismo de Portugal autorizou-nos, pela primeira vez, a utilizar a ‘umbrella’ “VisitPortugal” no stand, antes tínhamos apenas uma faixa que dizia Portugal. Embora para o público isso não tenha uma grande relevância, institucionalmente é muito importante a identificação como “VisitPortugal”.
O stand esteve permanentemente cheio de manhã ao fim da tarde, sem intervalos e os alemães que lá vão têm um grande poder de compra, vão lá para decidirem as suas férias não para levar papel, até porque as pessoas colocam perguntas muito concretas que demonstram que têm um bom conhecimento de Portugal e da nossa região.
Posso dizer que a Madeira está no stand de Portugal mas há outros dois stands da Madeira, concretamente agrupamentos de hotéis que já vão à feira há muitos anos.
Quando eu entrei para o turismo, o mercado alemão era praticamente residual no Alentejo, agora é completamente diferente, fechou 2019 em terceiro lugar mas muito perto do Brasil e agora está em segundo lugar, logo a seguir a Espanha. Isto não foi só devido às feiras – nós estamos a ir à ITB que agora passou, e bem, a ser apenas para profissionais, vamos à CMT e à feira de Munique.
Depois da FITUR fomos à Boot, em Dusseldorf, mas apenas porque foi a finalização do programa das estações náuticas e, portanto, esteve o Alentejo, o Centro e o Porto e Norte. Ainda na Alemanha o que eu gostaria de retomar era “bater” pequenas cidades, em torno dos 100 mil habitantes mas com grande poder de compra. Habitualmente, íamos com a Olimar e fazíamos três ou quatro cidades numa semana, para contactar com agentes de viagens e também para fazer uma apresentação do Alentejo e de Portugal. Foram ações que tiveram um excelente resultado para nós.
“Na minha opinião, sem desmerecer o atual ministro da Economia que até parece estar muito mais sensível ao turismo do que aquilo que eu esperava, continua a fazer falta um Ministério do Turismo para ter assento no Conselho de Ministros. O ministro da Economia, por sensível que seja às “coisas” do turismo, não é ministro do Turismo, tem muita coisa com que se preocupar”
As verbas atribuídas às Entidades Regionais – e faço esta pergunta porque é também presidente da ERT do Alentejo e Ribatejo – são as que esperavam?
Nós já sabíamos que ia ser a mesma verba mas o nosso problema nem sequer é a verba do Turismo de Portugal, o problema é que as candidaturas a fundos comunitários que tínhamos acabaram no fim do ano passado e este ano na Agência temos o orçamento mais baixo de sempre. Na Agência Regional de Turismo os financiamentos que temos são a contratualização com o Turismo de Portugal, fundos comunitários, contribuição dos associados e alguns serviços que prestamos a Câmaras ou Comunidades Intermunicipais mas que representam um valor residual. Desapareceram os fundos comunitários e ainda não abriram outros – as promessas das CCDR é que iriam abrir no princípio do ano – e isso trouxe-nos ao ponto em que estamos, com o mais baixo orçamento de sempre para a promoção externa, mas estou esperançado em que abram as candidaturas. Quando isso acontecer posso fazer uma alteração orçamental que permita colocar o orçamento nos valores de que precisamos.
Portugal ainda não entendeu o que é que tem que investir no turismo. Basta falar com o responsável da região da Extremadura espanhola para se saber que têm dez vezes mais orçamento que a ARPTA só para investir em promoção e o que é facto é que no que toca a dormidas de estrangeiros eles têm o mesmo valor que nós. Nós fazemos milagres com os valores que temos, mas não pode ser assim.
Na minha opinião, sem desmerecer o atual ministro da Economia que até parece estar muito mais sensível ao turismo do que aquilo que eu esperava, continua a fazer falta um Ministério do Turismo para ter assento no Conselho de Ministros. O ministro da Economia, por sensível que seja às “coisas” do turismo, não é ministro do Turismo, tem muita coisa com que se preocupar para além do turismo e agora até o secretário de Estado já não é só do Turismo, é também do Comércio e dos Serviços e dando mais responsabilidade ao secretário de Estado do Turismo ele tem menos tempo para se focar no nosso setor e eu tenho uma grande dificuldade em entender isto.
Quais são os objetivos que tem para este ano?
Nós somos sempre surpreendidos, pensámos que a recuperação vinha em 2024 e afinal veio em 2022, e só com três trimestres. Eu costumo dizer que espero sempre o melhor e estou preparado para o pior mas a não ser que aconteça uma catástrofe penso que não vamos ter um ano pior do que 2022.
Há um problema que temos que resolver que é o da falta de mão de obra. Penso que o Governo deu alguns passos importantes na alteração da lei da imigração, facilitando a vinda de imigrantes mas há um estrangulamento nos postos consulares que não dão o necessário despacho e tem que haver uma política articulada. Sei que o Algarve está a trabalhar bem este assunto com a Organização Internacional para as Migrações. Nós também gostávamos de entrar por aí mas queríamos falar primeiro com os empresários para podermos fazer um levantamento rigoroso das necessidades e isso não é trabalho da Agência, é trabalho da ERT, mas penso que temos a obrigação de o fazer para tomarmos as necessárias decisões. Se tivermos que integrar algumas delegações para ir procurar mão de obra no estrangeiro penso que o devemos fazer porque muitos empresários não têm capacidade para isso.
Há um outro objetivo, que partiu de uma ideia do meu vice-presidente, que é o de o Alentejo, no futuro, representar 1% do PIB nacional.