Viagens El Corte Inglés poderá avançar para operações charter em parcerias de risco, diz Ricardo Cardia
Nesta segunda parte da entrevista a Ricardo Cardia, diretor-geral da Viagens El Corte Inglés, falámos da estratégia de expansão em Portugal que, segundo o responsável não irá passar pelo franchising, dos objetivos para a unidade de negócio de Business Travel mas também da estratégia a implementar ao nível do produto e da notoriedade da marca.
Com a definição que as equipas vão tendo, há uma estratégia a seguir e a estratégia macro, em muitos casos, passa pela aquisição, pela montagem de novas estruturas. Estão a pensar algum desenvolvimento nessa área?
Sendo a empresa que somos, estarmos desatentos nunca é solução. Temos que estar atentos ao comportamento do mercado, às oportunidades que aparecem. Naturalmente, temos uma ideia de expansão mas não é uma expansão no sentido de abrirmos uma porta, colocarmos um ou dois agentes de viagens, colocar uma marca e começar a vender. A nossa estratégia de expansão passa por colmatar falhas num determinado tipo de produto que sabemos que o mercado procura e que achamos que somos das poucas marcas em Portugal que podem trabalhar nesse sentido e oferecer algo mais personalizado, mais especializado, mais adequado àquilo que é a necessidade do cliente. Nós temos muito o desafio de vender o Caribe mas vender Caribe a 700 ou 800€, todos conseguem, vender uma outra experiência de Caribe, vender uma viagem que uma pessoa já fez mas que pode sentir de uma forma completamente diferente é que fideliza o cliente. Portanto, essa estratégia de expansão vai sempre passar pela oportunidade e esta não está associada ao preço, está no talento que conseguimos ter e naquilo que é a estratégia a médio e longo prazo da empresa.
Misturou aqui um pouco a questão da venda do produto com a estratégia de crescimento físico. Eu estava a falar de crescimento através de novos postos de venda. Têm alguma linha de ação a este nível, seja através de franchising, através de lojas próprias…?
O franchising não é uma opção porque o nível de serviço que queremos manter é um nível de exclusividade, um nível “premium”, e como eu dizia, sabemos que vender é fácil, vender bem é mais difícil e nós queremos vender bem e isso implica ter equipas competentes, que saibam o que estão a vender e que tenham a capacidade de envolver o cliente, permitindo-nos continuar a crescer. Na nossa opinião, o negócio das agências de viagens físicas passará sempre pela fidelidade, pela credibilidade e pela paixão com que o cliente vai comprar e com que o agente de viagens vende. Se conseguirmos captar essas variáveis, estaremos mais próximos do sucesso.
O que está a querer dizer é que poderá avançar-se que a Viagens El Corte Inglés vai abrir uma nova loja em Lisboa, mas não que irá abrir 10 lojas durante um ano? Ou seja, não existe um número?
Existe esse número, mas não o quero dizer. É fácil dizer que queremos abrir 10, 20 ou 30 lojas mas tudo dependerá de podermos manter o padrão, de encontrarmos as pessoas certas, de percebermos como é que o negócio vai evoluir, até porque perspetivar algo a quatro ou cinco anos tem as suas desvantagens.
Portanto, o número existe internamente?
Existe internamente em Portugal, ou seja, a decisão de expansão passará sempre pela direção em Portugal e a responsabilização passará sempre pela decisão que tomarmos.
Dentro da área do Business Travel o objetivo é cumprir e ser credível
E para crescer no corporate, qual é a estratégia? Potenciar o departamento indo buscar profissionais de outras agências, já que é difícil captar talento nesta área, ou formarem pessoas internamente?
Uma das primeiras coisas que queremos dentro da área de Business Travel é sermos credíveis, ter capacidade de criar uma relação que não é preço, é serviço, é cumprir os SLAs [Service Level Agreement – Acordo de Nível de Serviço], cumprir com aquilo que foi identificado no momento do contrato e não estarmos numa relação em que captamos o cliente e a partir de certa altura, cada um faz o que quer para poder vender. Pegando na questão do talento, olhando para aquilo que foi a postura do Corte Inglés nos últimos três ou quatro anos, ninguém estará preocupado com uma pandemia ou uma guerra porque aquilo que fizemos foi manter os postos de trabalho, manter um rumo naquilo que era a carreira de cada um e manter o seu foco e a sua disponibilidade para trabalhar. É conhecido que houve restruturações em empresas, houve despedimentos, e nós mantivemos praticamente toda a estrutura, apenas com ajustes muito pontuais em cada área de negócio, fizemos um ajuste na área financeira, um ajuste na área de produto e hoje mantemos praticamente todo o talento que tínhamos e que quis ficar connosco porque achamos que é na capacidade e na manutenção de talento que vamos conseguir…
Quanto ao departamento Pharma, conquistaram recentemente uma nova empresa para trabalharem em termos de corporate?
Nós criámos um departamento Pharma porque tínhamos as pessoas certas para o criar, tínhamos uma equipa que não era uma equipa coesa mas que trabalhava de forma independente, tínhamos inclusivamente outplants na Novartis e a ideia foi se já temos uma equipa a trabalhar separadamente e se achamos que temos capacidade de lhe dar “músculo”, de trazer outro tipo de empresas e se podemos fazê-lo crescer, faz sentido criar esse departamento. É um departamento muito bem chefiado por uma pessoa que já leva mais 15 anos na empresa e que tem com ele gente muito capaz e de uma grande dedicação e agora falta-nos dar-lhe mais visibilidade mais visibilidade e mais força.
Ter produto próprio pode passar por parcerias e lugares de avião em firme
Vamos mudar um pouco o rumo à nossa conversa para falar de produto. Vocês criam algum produto ou ele é totalmente comprado a parceiros de negócio?
Nós apostámos na vinda do Pedro Pereira [diretor de Marketing & Produto] para mudar o paradigma do produto, ou seja, criar um departamento, dotá-lo de uma definição e de uma liderança que achamos que o Pedro pode oferecer mas essencialmente de uma criatividade e de uma capacidade de gestão com os parceiros e de uma proximidade e forma de estar que achamos que a Viagens El Corte Inglés merece e deve ter. Nesse sentido, sim, estaremos sempre disponíveis para analisar possibilidades de risco, para abrir oportunidades com parceiros que até agora nunca tivemos. Estamos disponíveis para criar algo que o mercado português, de certa maneira, ainda não descobriu e que nós, com base no que é a dimensão da contratação das duas empresas[Viagens El Corte Inglés e Logitravel], com base na força de faturação das duas empresas, e acima de tudo com o conhecimento e a tecnologia que podemos oferecer, garantidamente que vamos estar na criação de produto.
Quando se fala em poder disponibilizar capacidade para risco, é o mesmo que dizer que pode haver alguns compromissos ou parcerias com lugares firmes, em algumas operações charter, ou seja, constituindo o embrião de um operador turístico?
Quando se tem a maior distribuidora da Península Ibérica não se pode, em nenhum momento, dizer que não se está disponível para fazer uma coisa dessas.
Podem ter várias parcerias porque temos no mercado operadores com produtos muito distintos – uns mais fortes em destinos de proximidade, até quatro horas e voo, outros mais fortes na longa distância…
Deixe-me colocar as coisas outra forma: nós estamos a centrar-nos na Viagens El Corte Inglés mas existe uma distribuição que nós temos em B2B, através da Smytravel e temos uma distribuição em B2C que é a Logitravel, que é a maior agência online em Portugal. Com o lançamento do nosso online, do online da Viagens El Corte Inglés, no próximo ano, com a nossa distribuição B2B e da B2C, eu diria que não se trata de um risco mas de um sucesso.
Mas estão preparados para fazerem esses allotments com vários operadores, para o pequeno e longo curso?
Quando vejo quatro operações de fim de ano para o Brasil e depois acrescentarem ainda mais voos, acredito que sim. Naturalmente, será sempre um risco mas se pensarmos as coisas no momento certo, se as contratarmos no momento certo e se as colocarmos no mercado no momento certo e tivermos um produto que nos diferencie daquilo que está no mercado, podemos ter esse risco. Existe muito a ideia do preço mas para mim o preço é o que o cliente quer pagar e dentro daquilo que o cliente quer pagar sabemos que se comprarmos 50 lugar e vendermos 20 na Viagens El Corte Inglés, vamos vender um determinado tipo de hotel, se vendermos 20 na Logitravel vendemos outro tipo de hotel e se vendermos 10 dentro daquilo que é a Smytravel, vendemos ainda outro tipo de hotel, e aqui temos a capacidade de distribuição para os vários segmentos e para o que pretendemos que é, basicamente, termos cada vez mais uma consciência de grupo e uma unificação em termos de decisão.
Isso quer dizer que já vão entrar para o final do ano em algumas operações especiais?
Não, não vamos.
Então o caso do Brasil foi um mero exemplo?
Não, estou a abrir a possibilidade de acontecer. São as parcerias que encontramos e que apostam em nós que nos ajudam a distribuir. Neste momento, se houver uma necessidade de distribuição, estaremos disponíveis para o fazer.
Uma das dúvidas que pode ter ficado na mente de quem nos está a ler é se quando assumem um negócio com um operador compram logo para as três empresas ou só para a Viagens El Corte Inglés?
Aquilo que fazemos é identificar o negócio para todas as empresas do grupo, ou seja, o Grupo Corte Inglés inclui todas essas empresas que estamos a falar, ou seja, naturalmente que temos empresas dentro do grupo que estão em velocidade de cruzeiro – a Logitravel não precisa de uma coordenação própria, a Smytravel tem ma gestão muito autónoma – e nós acabamos por estar ligados à operação diária da Viagens El Corte Inglés mas aquilo que são oportunidades e possibilidades que vamos encontrar no mercado será sempre para trazer valências e negócio para todo o grupo.
Nós temos unidades de negócio que são transversais em toda a empresa, por exemplo, temos uma unidade de cruzeiros que dá serviço a todo o grupo e depois cada área vai trabalhar esse produto de acordo com o seu posicionamento no mercado. Em Portugal, temos autonomia no sentido de encontrarmos o produto mais importante para o mercado nacional até porque o cliente português é diferente do espanhol e, por isso, tem necessidade de um produto diferente. Por exemplo, não existem muitos operadores que trabalhem o mercado de Cabo Verde em Espanha e o mercado do Brasil é trabalhado de forma diferente – em Espanha é mais Rio de Janeiro – pelo que há um conjunto de produtos para os quais temos que fazer contratação cá em Portugal.
“Hoje, um hotel que aceite trabalhar com o Grupo Viagens El Corte Inglés está a negociar com todo o seu universo, mas a distribuição poderá ser totalmente diferente consoante as marcas, ou seja, garantimos uma distribuição que é geral mas é segmentada”
Passa-se o mesmo no que se refere à hotelaria?
Em termos de hotelaria, hoje, o universo do Grupo Viagens El Corte Inglés tem a melhor contratação nacional fruto do histórico de contratação no território português, não só a nível de qualidade de preço mas também de expansão, ou seja, somos fortes dos Açores ao Algarve. Acreditamos que temos a contratação mais madura e mais completa.
Isso porque fazem a contratação ao nível da Península Ibérica?
Negociamos a nível da Península Ibérica mas, essencialmente, em cima das vendas que acabamos por negociar. Ou seja, quando negociamos com um hotel e começamos a vender, o hotel tem a noção da capacidade de distribuição. Hoje, um hotel que aceite trabalhar com o Grupo Viagens El Corte Inglés está a negociar com todo o seu universo, mas a distribuição poderá ser totalmente diferente consoante as marcas, ou seja, garantimos uma distribuição que é geral mas é segmentada.
Têm a noção de que se perguntarem a 10 portugueses o que é o El Corte Inglés eles nunca falarão em viagens?
Temos.
Como é que pensam dar a volta a isso?
Muito facilmente, encontrando mecanismos de presença contínua. A marca é forte, é credível, é premium, aquilo que pensamos é valorizar a marca pelo profissionalismo, pelo premium, pelo produto. Em 2023, nós vamos ser a marca que mais se irá desnivelar de todas as outras, é um posicionamento e uma força de risco que vamos ter mas aquilo que nós queremos é não oferecer um serviço de agência de viagens mas sim um serviço com o qual as pessoas se sintam confiantes, desde que entram na agência e recebem aconselhamento até ao pós-venda, passando, evidentemente, pelo produto. Isto irá levar-nos ao ponto em que o El Corte Inglés está que é o de ‘nós vamos, nós compramos e estamos satisfeitos’. Isto é algo que hoje já acontece embora não tenhamos a mesma abrangência, mas com o lançamento do site e com a nossa capacidade de estar nos pontos mais importantes com as campanhas mais interessantes e com a nossa voluntariedade de estar presente na maior parte dos eventos, vamos conseguir dar uma grande notoriedade e força à marca.
Para ler a primeira parte da entrevista a Ricardo Cardia, diretor-geral da Viagens El Corte Inglés em Portugal, clique aqui.