Vanda Pina disse “não” ao turismo e formou-se em gestão de empresas mas apaixonou-se pela profissão de agente de viagens

É general manager da Travel 2000, agência de viagens que fundou com o seu pai, no Barreiro, em abril do ano 2000, e é hoje uma apaixonada pelo mundo das viagens e turismo, tanto que não se vê a fazer outra coisa, como disse ao Turisver. Mas, na conversa que mantivemos, confessou que na juventude, quando seguiu o curso de gestão de empresas, não era uma carreira no turismo, aquilo que pretendia.
Foi seu objetivo, desde bastante cedo, entrar neste meio do turismo?
Não, eu tirei o curso de Gestão de Empresas no ISLA onde, na altura, o curso mais conhecido era, realmente, o do turismo, curso no qual eu tinha imensos amigos. Muitos até me perguntavam porque é que não tinha ido para o curso de turismo se eu até gostava dessa área, mas a verdade é que não era isso que eu queria. Ainda ponderei tirar o curso de gestão hoteleira mas turismo, à partida, não era aquilo que eu queria fazer.
O meu objetivo era ir mais para a área da logística, ligada à gestão, mas mais logística. Acabei o curso em 1999, que coincidiu com a saída do meu pai de Quimigal Adubos, mais ou menos em julho de 99.
Arranjei emprego – na altura era fácil arranjar emprego -, e o meu pai começou à procura de negócios, para começar a trabalhar por conta própria e surgiu-lhe a oportunidade de abrir uma agência de viagens com a Golden Travel, nós fomos a primeira agência Golden Travel que abriu, e ele, na altura, perguntou-me se eu queria entrar no projeto – achei uma boa ideia e assim começou a minha aventura no turismo.
Depois começaram as formações, começámos a tentar perceber o que era isto das agências de viagens, a tentar aprender o que era o Amadeus, o Galileo, coisas de que nunca tínhamos ouvido falar… A verdade é que fiquei apaixonada pelo ramo, e não me vejo a fazer outra coisa neste momento. É mesmo isto que eu gosto de fazer.
Com a formação que teve, não havia negócios melhores?
Ai havia com certeza, mas mais apaixonantes acho que não. Isto tem mesmo tudo a ver comigo e não me vejo a fazer outra coisa. Para abrir um negócio próprio na minha área de formação, também acho que não mas para trabalhar por conta de outrem tive grandes oportunidades.
Travel 2000 surge no mercado em janeiro de 2001 depois da “experiência” com a marca Golden Travel
Quanto é que se dá a passagem da Golden Travel para a agência com a atual denominação Travel 2000?
Foi só um ano depois. Nós abrimos a loja de rua em abril de 2000, e saímos em dezembro. Depois nem sequer fechámos, ou seja, no dia 2 de janeiro de 2001 comunicámos à Golden Travel que íamos sair da rede, e começámos a atender os telefones como Travel 2000. Mudámos os letreiros pouco tempo depois, e passámos a ter outra marca.
E porquê na cidade do Barreiro?
Porque somos do Barreiro. Havia muita gente a morar no Barreiro, fizemos um estudo marcado na altura. Na altura o Barreiro tinha 120 mil habitantes, hoje terá bem mais, e não havia agências de viagens, ou melhor, havia apenas uma que fechou dois anos depois, então nós decidimos que era uma boa oportunidade.
Dois ou três meses depois de nós abrirmos, abriu a Abreu, depois abriu uma Bestravel, e depois foram abrindo outras, mas na altura fomos a segunda agência do Barreiro, pelo menos em termos visíveis.
E o que é que mudou desde esse primeiro ano na agência, nomeadamente na forma de trabalhar?
Aprendemos muito. Eu lembro-me por exemplo que vender pacotes turísticos, fazer viagens à medida, era uma coisa que nem sequer nos passava pela cabeça. Era um pânico fazer uma viagem à medida. Hoje, o nosso grande nicho de mercado são realmente as viagens à medida, o tailor-made, e adaptar tudo à vontade do cliente. Mesmo numa viagem em voo charter, tentamos sempre introduzir qualquer coisinha que agrade ao cliente, nem que seja um transfere privado, uma excursão opcional. Portanto, a grande diferença acaba por ser essa, o passarmos da venda do charter para a venda do produto à medida.
Quando se olha para o Barreiro, a tendência é achar que não haverá clientes para o ‘fato à medida’…
Na realidade, cerca de 60%, ou mais, dos meus clientes não são do Barreiro, talvez porque nunca fizemos muita publicidade, a nossa melhor publicidade são os nossos clientes e por isso, os nossos clientes novos são amigos dos clientes antigos, pelo que a maior parte deles não é do Barreiro.
É engraçado porque eu tenho clientes em Braga, tenho clientes em Coimbra, tenho clientes no Porto, tenho clientes em todo lado. Estrou fisicamente no Barreiro porque moro ali mas não tenho muito mercado do Barreiro.
A tendência do ‘fato à medida’ começou quando?
Assim em tão grande percentagem, há pelo menos 10 anos.
“Continuamos a vender e continuamos a recomendar. A questão nem sequer é essa, a grande questão que se coloca nos charters é a dos descontos. Temos muita gente no mercado que faz descontos brutais e nós não praticamos a política do desconto, o que significa que a venda desse tipo de programa começa a ser muito menor”
E como é que olha para os pacotes dos operadores turísticos?
Continuamos a vender e continuamos a recomendar. A grande questão que se coloca nos charters é a dos descontos, temos muita gente no mercado que faz descontos brutais e nós na Travel 2000, não praticamos a política do desconto, o que significa que a venda desse tipo de programa sofre.
Quem procura preço, se compara com o nosso preço, que é o PVP dado pelos fornecedores, e procura o preço na internet, por exemplo, vê que o mesmo produto é muito mais barato. É verdade que fazemos um trabalho que na net não fazem, que é aconselhar o destino, aconselhar o hotel, dar a indicação sobre o que há para ver em cada destino, todas essas coisas.
Às vezes fazemos esse trabalho inglório e depois acabamos por não fechar a venda porque não sei quem tem mais barato ou porque na net viram mais barato, mas faz parte. Eu já desisti dessa luta, acho que é uma luta inglória.
É verdade que tenho clientes que me continuam a dizer olha, vi este preço não sei onde, mas vou marcar contigo porque tenho confiança, porque tu é que fizeste o teu trabalho, tu é que me dás as dicas, tu é que me dizes quais são os restaurantes bons em determinado sítio. Portanto, acabam por marcar comigo na mesma.
Mas também apostam no online, ou não?
Sou sincera, tenho descuidado um bocadinho o site. É uma coisa que eu tenho que aprofundar e ter mais em atenção. Nós temos uma equipa pequena na agência, e às vezes torna-se complicado dar atenção a tudo.
O online não é o nosso foco, é importante ter uma montra online mas a venda online pura não é, de todo, o nosso objetivo. Nós prestamos serviço, gostamos de prestar serviço. Aquilo que mais me custa é ter um cliente que marca tudo online e que não me pergunta nada, nem sequer sobre o hotel ou a companhia aérea porque, na verdade, viajar para um aeroporto ou para o outro pode fazer toda a diferença. Às vezes, por mais de 5 ou 10 euros, o cliente vai num voo muito mais cedo para um aeroporto muito mais perto do centro, e nós fazemos esse trabalho todo.
Entrada na GEA (agrupamento de viagens) foi para quebrar o isolamento
Quando é que decidiram entrar para um agrupamento de viajantes?
Somos GEA há 18 ou 19 anos, creio que desde Janeiro de 2006.
Foi por uma questão económica?
Na altura foi por uma questão de rentabilidade, principalmente devido à Soltour. Com praticamente todos os outros operadores nós mantivemos praticamente as comissões que tínhamos, que estavam acordadas com quase todos, mais 1% menos 1% mas a Soltour fazia uma diferença muito grande. Nós, na altura, vendíamos muito pacote charter e muito Bahia Principe e esse foi um dos motivos que nos levou a entrar num agrupamento.
Nós já começávamos a conhecer mais ou menos, toda a gente do mercado e não era por aí, era um bocadinho porque nos sentíamos também isolados, no nosso cantinho da margem sul e às vezes há coisas de que só nos apercebemos estando num grupo de gestão.
Os grupos de gestão não podiam já ter ido mais além na sua complexidade, em relação ao agente de viagens?
Essa é uma boa pergunta. Por um lado, sim, por outro eu compreendo que seja complicado devido à identidade individual. Cada um de nós é um mundo e a realidade é que às vezes, tentar trabalhar para 400 empresas em que cada uma tem o seu mercado, uma visão diferente da maneira de fazer e da maneira de ser, é complicado. Isso faz com que, por vezes, os próprios grupos de gestão queiram avançar com determinada coisa e não consigam.
Então, quando toca à marca é mesmo impossível. Aliás, eu tive uma má experiência com a Golden Travel, que me pôs logo de pé atrás. Mudar de marca é uma coisa que, para mim, é impensável. Se de um momento para o outro a minha agência mudasse de nome, automaticamente as pessoas iam pensar, que havia ali alguma coisa, algum problema.
Depois há a nossa identidade, o facto de nós sermos agências independentes tem mesmo a ver com isso. Nós gostamos de ser independentes, gostamos de ser nós a tomarmos as nossas decisões e acho que é isso que condiciona muito os grupos de gestão.
Enquanto um franchising faz as regras e quem lá está tem que as aceitar, com as agências independentes não é bem assim é mais o oposto.
“Do pós-Covid, 2023 foi o melhor ano, sim. Este ano, em termos de faturação global, acredito que não seja melhor que o ano passado mas em termos de rentabilidade, acredito que sim”
E expansão? Vocês têm uma loja só pensam expandir?
Temos uma loja só, já tivemos duas mas na altura não correu bem, até porque começámos a fazer os planos de expansão num ano bom e o ano a seguir foi desastroso, que foi o 2009-2010. O meu pai entretanto adoeceu e veio a falecer e foram 4 – 5 anos bastante complicados.
Mas não acho que seja boa ideia abrir mais lojas, até porque cada vez mais as coisas fazem reservas online, por e-mail, Messenger, WhatsApp, etc. Portanto, não vale a pena ter duas, três, quatro lojas. Acho que para nós não faz sentido.
Faz sentido, se calhar, aumentar a equipa?
Faz. O objetivo era esse mas veio o Covid exatamente no ano em que íamos fazer um investimento em termos do aumento do número de funcionários. Foi um ano e meio quase sem trabalhar, ou trabalhar com valores muito residuais e tivemos que repensar tudo. Agora é recuperar. É verdade que os anos têm andado a correr bem, se fossem numa continuidade do 2019, era fabuloso, mas não foi. Tivemos 2020, 2021 e ainda um bocadinho de 2022 menos bons.
Do pós-Covid, 2023 já foi o melhor ano de sempre? Este ano, vai ser melhor ainda?
Do pós-Covid, 2023 foi o melhor ano, sim. Este ano, em termos de faturação global, acredito que não seja melhor que o ano passado mas em termos de rentabilidade, acredito que sim. Nós também apostamos muito nisso, o mais importante para mim é servir bem o cliente, e é a rentabilidade. Dizer que vendemos muitos milhões não faz sentido quando a rentabilidade não acompanha o crescimento da faturação. O mais importante é tentarmos fazer uma empresa estável e crescer em termos de rentabilidade, e nisso este ano está a ser um ano bom.
Com a experiência destes anos todos, com a vivência que já tem deste meio, está confiante no seu futuro, que é o mesmo que dizer no futuro das agências de viagens?
Sim, estou, não acho que as agências de viagens vão acabar mas claro que haverá mudanças. Nós não somos os mesmos que abrimos em 2000, começámos na venda do charter e aos poucos as coisas mudaram e estamos no tailor-made.
Notamos que, principalmente no pós-Covid, há muita gente a contactar-nos, pessoas que antigamente não faziam compras por agências de viagens e agora compram. A consultadoria das agências de viagens é cada vez mais importante, é pena não estar muito valorizada e é pena o mercado não trabalhar todo para o mesmo, para valorizar a nossa profissão, que é algo por que temos que lutar: pela valorização do agente de viagens e das agências de viagens também porque nós sabemos o que fazemos.
Quando precisamos de arranjar um cano, vamos a um canalizador, se temos um problema legal vamos a um advogado, então porque é que quando viajamos não vamos a um agente de viagens e vamos à net?
Nós estamos cá para ajudar e para dar aconselhamento e acompanhamento aos clientes. Portanto, não acho, de todo, que as agências de viagens vão acabar.