TURISMO & VIAGENS: Após mais de 2 anos de pandemia, o que esperar no futuro?, por Jorge Catarino
Os efeitos que os dois anos de paragem forçada da atividade turística tiveram nas empresas e os desafios que têm que enfrentar, de imediato e no futuro próximo, a vários níveis são o foco do artigo de Jorge Aníbal Catarino.
Jorge Aníbal Catarino
JAC: Hotel & Real Estate – Investment & Asset Management Advisory – CEO & Founder
Paragem brusca e prolongada, de forte impacto
O setor do turismo, de grande importância para o desempenho da economia portuguesa, foi dos mais afetados pela pandemia, tendo-se defrontado com uma paragem brusca da sua atividade devido às fortíssimas restrições impostas à mobilidade dos turistas a nível mundial. Embora o setor seja relativamente jovem quando comparado com outros, e tenha passado por diversas crises no passado, por vezes decorrentes de eventos inesperados como terrorismo ou catástrofes naturais, de facto, nunca antes havia enfrentado uma queda tão abrupta e prolongada da procura e atividade turística!…
Empresas demonstraram surpreendente resiliência, mas estão fragilizadas
Por este motivo, e apesar da surpreendente enorme capacidade de resiliência de muitos empresários, as consequências económicas e sociais foram bastante violentas, e perduram ainda hoje, limitando sobremaneira o rápido regresso à normalidade anterior à pandemia por parte da maioria das empresas do setor do turismo, as quais saem lentamente desta profunda crise e em enorme debilidade financeira, com forte pressão sobre a tesouraria e sérias dificuldades em atrair investidores e/ou obter financiamento bancário, ainda que de curto prazo, até ao próximo Verão.
Acontecimentos recentes atrasam a recuperação do transporte aéreo (e do Turismo)
Neste momento, sendo certo que sem transportes não há Turismo e que o transporte aéreo tem uma enorme importância nos fluxos turísticos transfronteiriços, importa notar que, de acordo com as mais recentes projeções da Bain, as estimativas anteriores de recuperação do tráfego aéreo foram revistas no sentido do adiamento por mais um ano do desejado regresso aos níveis verificados em 2019, devido ao efeito combinado da invasão russa da Ucrânia, crescente inflação e manutenção das restrições Covid-19 na China. A Bain estima agora no seu cenário-base que o tráfego aéreo global atinja em janeiro de 2023 e de 2024 cerca de 82% e de 92% (a previsão anterior à atual crise era de 113% e de 117%), respetivamente, do volume verificado em 2019. E, a nível europeu, as estimativas de recuperação do tráfego intrarregional são que se chegue a cerca de 82%, 88% e 92% em janeiro de 2023, de 2024 e em dezembro de 2024, respetivamente, do volume registado em 2019, pelo que o regresso a este nível pré-pandémico só ocorrerá, eventualmente, durante o ano de 2025, não antes…
Persistem diversos desafios, incluindo no domínio da captação e retenção de talentos
Vale a pena notar que a retoma do transporte aéreo não tem sido ausente de problemas e dificuldades várias, associadas à débil saúde financeira de algumas empresas, ao enorme êxodo de colaboradores verificado nos anos da pandemia (de moto próprio, ou por decisão das empresas), a diversos problemas técnicos em sistemas informáticos desatualizados, bem como ao acréscimo de custo dos combustíveis. Efetivamente, aeroportos e companhias aéreas não estão a conseguir dar resposta ao aumento de procura registada com o abrandamento das restrições de viagem, tendo-se verificado inúmeros cancelamentos e atrasos, na Europa e nos EUA. Alguns analistas antecipam mesmo que o próximo Verão seja algo caótico. As companhias aéreas, os aeroportos e as rent-a-car não estão a contratar suficientemente depressa para responder à crescente procura de viagens, situação que demorará alguns meses a normalizar, pois, entretanto, muitos trabalhadores encontraram oportunidades de emprego mais estáveis e lucrativas financeiramente, tendo decidido não voltar ao setor do turismo. Em Portugal, a Randstad estima que o setor do Turismo tenha perdido durante a pandemia cerca de 27% dos trabalhadores, pelo que a captação e retenção de talento exige agora maior flexibilidade e a oferta de benefícios extrassalário.
Perfil do turista em permanente mudança, exigindo flexibilidade do lado da oferta
Segundo a Expedia (“Traveler Value Index Outlook 2022”), depois de dois anos de pandemia global, as pessoas valorizam cada vez mais as viagens e o tempo dedicado a atividades pessoais. No topo das prioridades estão as viagens flexíveis e a intenção de viajar de forma responsável, incluindo dar melhores gorjetas aos trabalhadores do setor do turismo e optar por destinos menos massificados por forma a limitar o impacte do excesso de turismo. Entre as principais tendências e previsões estão as seguintes: a) O desejo de viajar é agora muito alto, com preferência por mais viagens de mais curta duração, frequentemente juntando lazer e trabalho; b) Parece também haver, em geral, uma maior afetação dos orçamentos ao turismo, com os gastos a superar os níveis anteriores à pandemia; c) As viagens dos turistas serão mais responsáveis e conscientes, com a eventual adaptação dos seus planos de viagem devido à atual falta de trabalhadores na indústria do turismo, e considerando o impacto do COVID-19 nas comunidades locais; d) De igual modo, um número crescente de turistas procura minimizar o impacto da sua viagem no meio ambiente, mesmo quando requeira um investimento extra; e) Após os últimos dois anos, há ainda e sem dúvida, um foco maior em viagens de reforço do bem-estar pessoal, parecendo que estas terão um efeito curativo para muitos.
Conclusão
Embora nada fizesse prever uma paragem forçada tão prolongada do setor do turismo, e nenhuma empresa estivesse completamente preparada, na verdade, as empresas mais ágeis resistiram melhor e estão agora mais preparadas para enfrentar os próximos desafios. Esta, como anteriores crises, acelerou sobremaneira o processo de seleção natural das empresas mais bem preparadas, tornando o setor do turismo mais robusto e resiliente a crises futuras. Importa agora que estas empresas se adaptem muito rapidamente para que possam conseguir vantagens competitivas num ambiente que está em rápida evolução, reganhando a maioria das capacidades de que dispunham antes da pandemia COVID-19.