“Tendências Tecnológicas em Hotelaria e Turismo: IA e os itinerários turísticos”, por João Pronto
Num artigo em que fala da utilização da IA para idealizar e conceber itinerários turísticos, João Pronto conclui que “a utilização deste tipo de tecnologia vai potenciar a operação turística, principalmente na componente diferenciadora da prestação de serviços turísticos, mais do que uma simples ameaça aos profissionais e organizações turísticas”.
João Pronto, ESHTE
Professor Especialista em Hotelaria e Restauração
Professor Adjunto – Ciências da Informação e Informática
Coordenador de Estágios
Neste artigo irei descrever algumas das aplicações suportadas pela nova geração de aplicações suportadas por Inteligência Artificial (IA) Generativa na idealização e conceção de itinerários turísticos.
No que concerne à inteligência Artificial, e apesar de todo o “caos e ruído inerente” que o surgimento de soluções baseadas em tecnologia IA está a suscitar, também no turismo, desde conceitos contraditórios, a “inverdades” de aplicação, ainda é cedo para se “estabilizar conceitos e tendências da IA aplicadas ao Turismo”, mas creio que seja o tempo de pelo menos tentarmos sistematizar ideias e descrever (ainda que resumidamente) algumas das aplicações mais utilizadas no desenvolvimento de itinerários turísticos.
Nestas últimas semanas tenho estado a testar aplicações de IA generativa que possibilitam, tanto ao turista como ao profissional de turismo, a capacidade de se aconselharem, recorrendo a linguagem natural, à descoberta de percursos turísticos.
Tenho observado em fóruns de discussão fechados, de profissionais de turismo, desencanto, frustração e até a ideia de que este tipo de aplicações lhes vão retirar a capacidade de prestarem serviço personalizado aos turistas, dado que estas aplicações tendem a fornecer (ainda) maior autonomia aos turistas, na medida que se podem informar mais e melhor recorrendo a estas plataformas, do que o faziam até ao surgimento destas aplicações, através da pesquiza de informação turística online, no entanto, estou certo de que esta é a forma de observar o “copo meio vazio” e tentarei demonstrar nesta segunda parte deste artigo, a componente “copo meio cheio”.
Há a noção de que, como a informação turística online está dispersa, a esmagadora maioria dos turistas não têm conhecimento, tempo ou a mesmo a paciência para pesquisarem e formularem autonomamente percursos turísticos sem o auxílio de profissionais de turismo, ou nenhuma das características apresentadas, o que faz com que a esmagadora maioria dos turistas continuem a recorrer aos profissionais de turismo, principalmente aos agentes de viagens para se aconselharem sobre destinos e percursos e experiências turísticas.
A esmagadora maioria dos turistas, mesmo consultando os inúmeros fóruns temáticos nos quais outros turistas partilham e opinam sobre as experiências vividas, continuam a recorrer, e ainda bem, aos agentes de viagens, a guias turísticos e consultores de viagens em geral.
Com o surgimento deste tipo de ferramentas alimentadas por tecnologia de Inteligência Artificial generativa, há os fundados receios que seja desta vez que uma percentagem considerável destes profissionais de turismo deixe de conseguir fazer a diferença no aconselhamento de viagens personalizadas, por e simplesmente nem sequer serem consultados… “só que não”…
Estou fortemente convicto que, da mesma forma, quando surgiu e se massificou a World Wide Web em que, não só, os turistas ficaram mais “instruídos” com mais e melhor conhecimento sobre os destinos turísticos em geral e as potenciais experiências turísticas em particular, mas também os diferentes agentes de turismo consolidaram o conhecimento adquirido na operação diária com mais e melhor informação turística, pois, para além de terem as mesmas possibilidades de qualquer pessoa consultar informação turística online, têm “algo mais” e esse “algo mais”, não é um pormenor mas sim um “pormaior” na medida em que os profissionais de turismo têm o conhecimento técnico e muitos têm ainda a experiência vivida acumulada, o que lhes permite consolidar mais e melhor no mercado competitivo, fazendo claramente a diferença na criação e desenvolvimento de experiências turísticas personalizadas.
Com a Inteligência Artificial será exatamente a mesma situação, todas as pessoas que tenham um pouco de tempo, paciência, perseverança e algum conhecimento tecnológico, vão conseguir aconselhar-se, recorrendo a sistemas de linguagem natural, que conseguem apresentar-se com resumos de itinerários turísticos genéricos, até à obtenção de itinerários turísticos pormenorizados, “à medida” e de acordo com os requisitos solicitados pelo potencial turista, assim os turistas o desejem, e obviamente tenham capacidade, também financeira, de o obter.
Mas os diferentes atores turísticos, também vão poder fazer exatamente o mesmo, e mais ainda, há ferramentas tecnológicas que são “autênticos” agregadores de conteúdos turísticos, e que não partilham esse conhecimento com os potenciais turistas, pela simples razão que os turistas não têm as base de dados nem de conhecimento interno que permita a estas aplicações de inteligência Artificial difundidas aos consumidores se alimentarem de conhecimento especializado, através das famosas interfaces em XML[1].
Pelo que tenho interagido com as plataformas: Layla, Tripwise, iplan.ai, Nowy, Monica, e ainda PlanTrips AIRoam, e complementarmente, descreverei o Arc Search que é um género de um ChatGPT consolidado num motor de busca e um browser em simultâneo… já lá iremos…
Várias destas aplicações ainda só conseguem responder e oferecer-nos propostas sobre as principais cidades e destinos turísticos, ainda hoje, dia 7 de julho de 20024, tentei obter percursos turísticos para uma família de 4 PAX, e adultos, uma filha de 17 anos e outra de 11, para a costa do Estoril, e só algumas das aplicações infra descritas me conseguiram responder, razão pela qual optei por solicitar um percurso turístico para Lisboa, durante 4 dias, para a minha família, com as seguintes premissas: gostamos de visitar museus, fazer um city-tour pela cidade, bairros e restaurantes tradicionais, e experienciar pelo menos um jantar num restaurante com estrela Michelin.
Todas as aplicações acima referenciadas forneceram itinerários diários para cada um dos dias, sendo que Layla apresentou o itinerário em português do Brasil, com o ambiente gráfico infra:
[1] Uma interface em eXtended Markup Language – XML – também designada por API – é um programa que permite interligar duas ou mais aplicações informáticas, sejam internas ou externas às organizações (também) turísticas.
E no final apresentou 3 botões: “Mais museus, por favor”, “Restaurantes vegetarianos” e “mais Atividades noturnas”, mas colocou ainda, a opção de lhe perguntar em texto livre, qualquer outra opção.
Tripwise apresentou o itinerário suportando a informação em texto, com a geo-localização dos principais locais de visita, com o ambiente gráfico abaixo representado:
E no final, apresenta vários botões em que podemos adicionar mais locais a visitar ao nosso percurso turístico, e, quando selecionamos o primeiro dia, apresenta-nos a opção de selecionarmos o ponto de partida para o itinerário por forma a otimizar o mesmo, colocando a opção de texto ou de acesso ao Google Maps, e depois de selecionado o ponto de partida, define o trajeto com várias opções de escolha.
No entanto a comunicação é realizada sempre em língua inglesa.
A aplicação iplan.ai apresenta um itinerário suportado por fotografias de cada local a visitar, com descrição geográfica do mesmo, como infra apresentado, misturando os idiomas português e inglês:
No final, da mesma dos anteriores concorrentes, permite-nos adicionar mais pontos de interesse divididos em “restaurante” e “Atividade”, em que “Restaurante” apresenta vários restaurantes concretos existentes em Lisboa, e “Atividade” apresenta ainda uma subdivisão de “Histórico”, “Arte e Cultura”, “Natureza”, “Compras”, “Comida”, “Entretenimento”, “Desporto” e “Relaxamento”, e quando selecionamos uma destas opções, apresenta-nos fotos e um pequeno resumo de cada uma das opções selecionadas, em inglês.
Nowy, apresenta-nos a possibilidade de personalizarmos o destino onde pretendemos ir, com até três preferências entre “Must-see Attractions”, “Beach”, “Local Culture”, “Foddie”, “Wine”, “Luxury”, “History”, “Outdoor Activities”, “Shopping”, “Arts & Theater”, “Museums” e ainda ”Adventure & Sports”.
No entanto, aconselhou-me a ir a dois restaurantes Estrela Michelin no mesmo dia… não é que não consigamos ter duas experiências gastronómicas exigentes no mesmo dia, mas não me parece que eu, a minha mulher e as duas filhas consigamos ter estômago para estas duas experiências no último dia…
A aplicação Monica, que tem imensas funcionalidades específicas como “Produtividade”, “Programação”, “Educação”, entre outras, também tem a opção em “lifestyle” de se obter “Travel Planner” e foi nesta componente que apresentou um potencial itinerário a Lisboa, indicando as fontes que suportaram o mesmo conforme infra:
Como não referi quantos dias pretendia, apresentou apenas um resumo, e como não era o que pretendia, de seguida solicitei os 4 dias de viagem, ao qual me respondeu com uma proposta para os 4 dias, dividindo a viagem entre manhã, tarde e noite, no final descreveu 3 recomendações: transporte, calçado confortável e reservas, a minha mulher adorou a indicação de reservas antecipadas…
A aplicação PlanTrips AIRoam resume o que pretendemos fazer no topo da aplicação e abaixo descreve cada um dos dias, com o itinerário, fornecendo para cada ponto de interesse uma foto e descrição do mesmo, e ainda a opção de se visitar o site (sempre que exista ou o tenha conseguido encontrar), aquisição de bilhetes, se for o caso, de contactar ao contacto do destino, se existir, e ainda ligação ao Google Maps para geo-localização do mesmo. Os conteúdos apresentados são sempre em inglês como podemos observar abaixo.
E ainda o ArcSearch – comecei a utilizar esta plataforma porque fui convidado a apresentar uma comunicação numa feira de Hotelaria, em Nice, em janeiro do próximo ano, e quando chegámos a acordo acerca do tema da apresentação, solicitaram-me que apresentasse um breve abstract e ainda um pequeno vídeo para resumir o tema da apresentação.
Como estava numa altura em que os meus alunos estavam a apresentar projetos e logo a seguir a fazerem exames que eu tinha de corrigir, e ainda tinha os estágios dos alunos da ESHTE para validar, e este ano foram mais de 700 protocolos, mais de 100 internacionais, e ainda a família… o tempo não abundava, e casuisticamente nas minhas pesquisas matinais, li numa revista online de tecnologia que tinham testado esta aplicação, e do que li, fiquei com a sensação de que esta plataforma conseguiria resumir os meus próprios artigos de opinião, e me descrevesse o abstract que necessitava urgentemente de criar.
E assim foi, indiquei em viva-voz “pretendo um resumo dos artigos de hiperpersonalização turística do João Pronto na Turisver.pt, mas com um enquadramento na jornada turística”.
Ao qual a aplicação resumiu os meus artigos com 3 tópicos principais e suportados por breves e sucintos conceitos aplicados a cada um dos tópicos, e consubstanciou-os com um dos exemplos que lhe indiquei num dos artigos.
Ajustei o texto à minha forma de escrever e enviei para o meu contacto na referida empresa, e recebi a resposta: fantástico, está excelente, não necessita de ajustar.
Fiquei com a convicção que, para atingir este tipo de expressão sem o recurso a esta tecnologia, teria despendido muito mais tempo, energia e pesquisa do que realmente aconteceu.
Fiquei adepto não só desta aplicação, mas fundamentalmente deste tipo de abordagem, que pode e deve, no meu ponto de vista, ser utilizada por profissionais de turismo, pois são uma excelente “alavanca” de consolidação de conhecimento!
Pelo que tenho a plena consciência de que a esmagadora maioria dos leitores destes meus artigos na Turisver, seja através do acesso ao próprio site da Turisver, ou via a minha divulgação nas minhas páginas do Facebook e do Linkedin, que também dão acesso aos artigos, são na esmagadora maioria profissionais da área do turismo, podem e devem recorrer a estas tecnologias (finalmente) emergentes, permitindo-lhes desta forma não só igualar o acesso ao conhecimento público, obtido pelos turistas mais ávidos em conhecimento turístico, como, com base no conhecimento adquirido na academia e na operação diária nas diferentes dimensões turísticas, vão obter mais e melhor conhecimento neste mundo progressivamente mais competitivo e concorrencial.
Razão pela qual considero que a utilização deste tipo de tecnologia vai potenciar a operação turística, principalmente na componente diferenciadora da prestação de serviços turísticos, mais do que uma simples ameaça aos profissionais e organizações turísticas!