Se a situação aeroportuária não se resolver os turistas não vão conseguir chegar a Lisboa, afirma Vitor Costa
À margem da visita ao Museu do Tesouro Real, o Turisver falou com Vitor Costa, diretor-geral do Turismo de Lisboa. As perspetivas turísticas para a cidade e para a região e os constrangimentos que se colocam ao seu crescimento, foram temas abordados.
Como é que está Lisboa em termos de turismo neste momento e quais as perspetivas para este ano?
O turismo em Lisboa está a correr de forma muito positiva e o entusiasmo é grande porque ao fim de dois anos de uma pandemia que foi muito dura, sobretudo para Lisboa, estamos, finalmente, a recuperar. Lisboa foi a região que mais perdeu com a pandemia e também a cidade europeia que mais perdeu, devido à nossa localização geográfica e à acessibilidade, que tem que ser feita por via aérea. Neste momento, estamos novamente a ganhar quota de mercado em termos nacionais, estamos de novo a praticar bons preços, a ter boas perspetivas, o próprio segmento de Meeting Industry, em relação ao qual havia mais dúvidas, também está a reagir bem e Lisboa está no topo das preferências e os nossos clientes internacionais têm vontade de viajar. Claro que há nuvens no horizonte, nomeadamente as questões da crise económica que vai resultar desta situação de guerra e isso poderá vir a ter efeitos no futuro.
Para já estamos esperançados em chegar ao final deste ano com 85% do nível de 2019, porque ainda tivemos dois meses muito maus. Penso que será possível atingirmos essa meta dos 85% e em 2023 esperamos poder atingir os níveis de 2019, mas há problemas graves e estruturantes, que no caso de Lisboa se resumem a um: o Aeroporto.
“Este fim de semana foi um caos completo [no Aeroporto de Lisboa], algo inadmissível, parece que há uma intenção de prejudicar apenas para beneficio das pessoas do SEF. Aliás, não entendo porque é que o SEF ainda não foi extinto já que a decisão já foi tomada há muito“
Um problema que, ao que tudo indica, vai manter-se nos próximos anos…
Pela nossa situação geográfica, nós não temos alternativa, nem para os portugueses nem para aqueles que nos querem visitar nem para os que escolhem Lisboa para vir morar ou trabalhar durante algum tempo. A nível europeu existe, e bem, uma estratégia de substituição das viagens de avião por outros meios de transporte mas é preciso dizer que isso funciona até distâncias de 700Km, ora no caso de Lisboa, tendo em conta as viagens internacionais, 700Km permitem chegar a Madrid, Sevilha, Bilbao e pouco mais, portanto temos que ter sempre a alternativa do transporte aéreo e a verdade é que não temos.
Nem está resolvida a situação estratégica do futuro, que é a solução aeroportuária de Lisboa, nem as questões mais imediatas, o que é uma grande preocupação. O que acontece, em relação à forma como são acolhidas as pessoas que chegam e que têm que esperar horas e horas no aeroporto, não tem explicação. Este fim de semana foi um caos completo, algo inadmissível, parece que há uma intenção de prejudicar apenas para beneficio das pessoas do SEF. Aliás, não entendo porque é que o SEF ainda não foi extinto já que a decisão já foi tomada há muito. As pessoas têm todas direito de reivindicar melhores condições mas há uma proporcionalidade que aqui não existe.
Por outro lado, e ainda no que toca à resposta imediata que é necessário dar, têm sido dadas notícias de que os investimentos no próprio Aeroporto de Lisboa também não foram ainda executados… Há um caminho que temos que fazer porque se não o fizermos ficamos isolados.
Já há quem diga que novo aeroporto só para 2030…
Se assim for, não poderemos crescer. Só podemos crescer em função da disponibilidade que temos e se a disponibilidade não aumentar não poderemos ter a expectativa de um crescimento quantitativo. Esta é uma questão de fundo em que não se entende a demora. Parece que, a certa altura, houve uma desistência do governo em relação à solução definitiva– nada é claro, nada se resolve com facilidade. Já se ouviu que o Aeroporto já não é prioridade porque houve a pandemia… É verdade que a pandemia diminuiu as viagens de avião mas agora estamos a regressar e queremos crescer.
A questão de fundo, que é uma questão a prazo, é termos uma ligação aeroportuária digna de uma cidade europeia que, para mais, é capital de uma região que quer progredir e não o pode fazer com uma infraestrutura obsoleta. Até lá, terão que ser resolvidas questões imediatas como a do funcionamento do SEF, as obras, a entrada em funcionamento dos novos sistemas, a saída rápida e tudo isto parece estar baralhado.
Na região de Lisboa temos um excelente posicionamento internacional, os turistas querem vir, a cidade precisa deles, vive em grande parte disso, e estes bloqueios impedem que haja uma situação normal de desenvolvimento. Tem que haver maior atenção e maior empenhamento na resolução destes aspetos, a nível imediato, de médio prazo e de longo prazo, de contrário os turistas vão estar lá mas não conseguirão chegar até nós.
Oferta hoteleira de Lisboa continua a crescer
Já no aspeto da oferta, Lisboa tem continuado a fazer o seu caminho?
Continua a existir oferta e continua a existir procura e esse é que é o drama. Continuamos a ter aumento da oferta, até porque havia investimentos em curso antes da pandemia que foram abrindo, há mais camas – talvez tenha havido um recuo por parte do Alojamento Local, mas a oferta continua a existir tal como há procura suficiente para responder a esse crescimento da oferta. É ridículo que, gerando o turismo a riqueza que gera, não consigamos ter as infraestruturas necessárias para que isto funcione, para que a procura venha ocupar a nossa oferta gerando riqueza para todos.
A Meetings Industry, foi um segmento que sofreu bastante com a pandemia. Está a recompor-se?
O MI sofreu mais e tem mais dificuldade em recuperar porque enquanto uma vagem de lazer se pode decidir de um momento para o outro, um congresso ou conferência necessita de mais algum temo, mas estamos a notar que também aqui está a haver uma boa resposta. Lisboa tem um bom posicionamento internacional a este nível, embora as suas infraestruturas nos imponham limites à realização de eventos. Pensou-se que com os hábitos ganhos durante a pandemia, as pessoas passassem a fazer tudo online, mas a verdade é que as pessoas não vão abdicar do contacto direto, do networking informal, do conhecimento dos destinos onde os eventos se realizam e tudo isso está a regressar.
Obviamente há soluções digitais que vieram para ficar, que poderão substituir algumas reuniões de empresas mas aquilo que é o cerne do MI e do corporate, os congressos e os incentivos, vai-se manter.
“Penso que nesta estratégia de aliar a cidade à região, apresentamos um produto muito competitivo em termos internacionais que nenhuma outra capital europeia pode apresentar na sua totalidade”
A região de Lisboa, como um todo, também está a recuperar?
Há uma estratégia que desenvolvemos já há alguns anos e que tem dado o seu resultado. Neste período da pandemia foi a cidade que sofreu mais uma vez que o seu produto tem muito a ver com o city break e com o MI, outras áreas, nomeadamente as ligadas a praias, tiveram quebras menores. Penso que nesta estratégia de aliar a cidade à região, apresentamos um produto muito competitivo em termos internacionais que nenhuma outra capital europeia pode apresentar na sua totalidade.
O Plano Estratégico teve que ser reanalisado devido à pandemia?
O Plano Estratégico está em revisão. Entrou em vigor em janeiro de 2020, foi suspenso devido à pandemia, e no final do ano passado resolvemos revisitá-lo e ver que alterações há a fazer. Esse trabalho está a terminar, deverá estar concluído dentro de um mês ou dois. Não tivemos pressa porque a situação não estava completamente estabilizada, nem está, mas o trabalho da Roland Berger está feito, agora é passar à discussão e aprovação.
Criar novos polos de atratividade a Lisboa
Acabámos de visitar o Museu do Tesouro Real, um equipamento cultural de luxo que vai beneficiar Lisboa em termos de atratividade. Para que ele se tornasse realidade, houve um grande envolvimento do Turismo de Lisboa?
Demos a nossa contribuição. O Turismo de Lisboa já tem experiência de ser um facilitador ao nível da criação de conteúdos para o nosso destino turístico, não só em termos da cidade como da região de Lisboa e este foi o projeto mais importante em que participámos. Fizemo-lo desde o início do projeto com o objetivo de poder proporcionar aos lisboetas, e aos portugueses em geral, o contacto com o seu património histórico – que estava guardado e ao qual o público não tinha acesso – e, ao mesmo tempo, criar mais um fator de interesse pelo nosso destino turístico.
Neste caso tratou-se de uma parceria entre a Cultura e o Turismo, através da qual conseguimos encontrar uma solução para encontrar os meios financeiros que faltavam, para o executar num prazo razoável e para fazer uma articulação com o setor do turismo que não é o único nem o principal destinatário, porque esta é uma questão de identidade nossa que devemos valorizar. Ainda assim, o Turismo tem aqui um papel de grande importância na viabilização, desde logo em termos do investimento porque o que foi aqui investido foram verbas turísticas, conseguidas quer através da taxa turística quer através de meios próprios da ATL.
Num investimento de 31 milhões de euros, 18 milhões vieram das verbas do Fundo de Desenvolvimento Turístico de Lisboa, a que se somaram mais nove milhões de euros da Associação Turismo de Lisboa, com 4,4 milhões a terem resultado da indemnização pelo roubo de jóias nos Países Baixos, há 20 anos.
Depois, a promoção internacional do equipamento, que é uma prioridade e que está já a ser feita, passa também pelo Turismo de Lisboa
Em termos de projetos que envolvam o Turismo de Lisboa, já sabem o que se vai seguir?
Neste momento estamos a colaborar na execução dos projetos financiados pelo PRR no âmbito da cultura na cidade de Lisboa e aí há um conjunto de investimentos previstos para os próximos anos em 15 museus e monumentos da DGPC [Direção-Geral do Património Cultural], incluindo a criação do novo Museu de Arqueologia, no local onde estava mas com uma intervenção profunda. Já estamos a começar a fazer estes trabalhos que, como sempre, têm muitas dificuldades, mas penso que os resultados vão ser muito positivos.
Este foi um trabalho para o qual fomos desafiados a participar pela Câmara de Lisboa, com o acordo imediato do Ministério da Cultura e da DGPC, até tendo em conta a experiencia que temos, nomeadamente neste projeto do Tesouro Real.