“Os salários no Turismo e o 8º ODS”, por Bonifácio Rodrigues
O impacto dos salários que são pagos no turismo na qualidade de vida dos trabalhadores, na comunidade local e na própria sustentabilidade do setor, são aspetos analisados neste artigo por Bonifácio Rodrigues, professor do ISCE, que sublinha que “para garantir que o setor de turismo seja sustentável em todos os aspetos, os salários dos trabalhadores devem ser considerados dignos”.
Bonifácio Rodrigues
Ph.D. Tourism, Leisure and Culture
Professor/Investigador ESCAD-IP Luso, ISCE-Odivelas e CiTUR-Estoril
“Não pode haver recuperação real desta pandemia sem uma ampla recuperação do mercado de trabalho. E para ser sustentável, essa recuperação deve basear-se nos princípios do trabalho decente, incluindo saúde e segurança, equidade, proteção social e diálogo social.”
Guy Ryder, Diretor-geral da OIT (2022)
O turismo é uma das indústrias mais importantes e lucrativas em todo o mundo. Não apenas gera receita para os destinos turísticos, mas também é um grande empregador. No entanto, muitas vezes os trabalhadores do setor de turismo recebem salários baixos, o que pode levar a um impacto negativo no pilar social da sustentabilidade.
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 144 milhões de pessoas trabalham no setor de turismo em todo o mundo. Embora o setor seja conhecido pela sua capacidade de gerar empregos, muitos desses empregos são informais e de baixa remuneração. Nos países em desenvolvimento, os salários dos trabalhadores do setor do turismo são frequentemente inferiores ao salário mínimo. E em países como Portugal, o salário médio é na sua maioria igual ou pouco superior ao salário mínimo nacional, o que tem originado uma fuga de profissionais devidamente capacitados, com formação técnico-profissional e superior, para outros países com melhores salários e condições de vida.
Isso pode ter um impacto direto na qualidade de vida dos trabalhadores e na sua capacidade de sustentar as suas famílias. Com salários baixos, pode ser difícil ou mesmo impossível economizar para emergências ou para o futuro, e os trabalhadores podem mesmo em circunstâncias limite ter de escolher entre pagar as contas mensais e/ou alimentarem-se adequadamente.
Além disso, os baixos salários no setor de turismo podem ter um impacto negativo na comunidade local. Sem salários adequados, os trabalhadores podem ter de recorrer a atividades ilegais, como o trabalho ‘paralelo’ com fuga aos impostos.
Em última análise, a falta de salários justos no setor de turismo pode ter um impacto negativo sobre a sustentabilidade do setor como um todo. Com trabalhadores insatisfeitos e comunidades locais desfavorecidas, o turismo pode não ser visto como uma indústria benéfica para a comunidade e pode não ser sustentável a longo prazo.
Para garantir que o setor de turismo seja sustentável em todos os aspetos, os salários dos trabalhadores devem ser considerados dignos e permitir a qualidade de vida inerente a quem tem um trabalho remunerado. Os empregadores devem ser incentivados a praticar salários justos, e os governos devem tomar medidas para garantir que as leis laborais sejam seguidas e aplicadas.
Além disso, os viajantes e turistas também podem desempenhar um papel importante na promoção de salários justos no setor de turismo. Ao escolherem destinos turísticos que valorizem os trabalhadores e paguem salários justos, os viajantes podem ajudar a impulsionar o setor em direção a uma maior sustentabilidade social.
Dados recentes (dezembro de 2023) obtidos através de um inquérito por questionário, promovido pela Associação Fórum Turismo junto dos estudantes de Turismo a nível nacional, e publicados em fevereiro de 2024, concluem que “(…) a insatisfação com os salários praticados é evidente, com uma alta taxa de estudantes a considerar a emigração como destino provável no início de carreira”.
A temática da sustentabilidade foi também um dos temas principais do 34º Congresso da AHP que teve lugar na Madeira no passado mês de fevereiro:
(…) Sob o tema “Horizonte 2030”, o evento deste ano propõe-se a refletir sobre o fim de uma década, também apontado como “o número mágico da Agenda 2030 aprovada pelas Nações Unidas, que engloba os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) como parte integrante do plano de ação internacional para o Desenvolvimento Sustentável (económico, social e ambiental) de forma interligada, considerando ainda os domínios da paz e segurança, o combate às alterações climáticas, a promoção do crescimento económico inclusivo e a adoção de padrões de consumo sustentáveis”.
“O nosso congresso está totalmente orientado para a sustentabilidade do negócio turístico-hoteleiro: para demonstrar às nossas empresas que seguramente têm desafios difíceis pela frente, mas podem e devem liderar uma transformação positiva em direção a um futuro sustentável” (in Programa do 34º Congresso da AHP).
Em conclusão, podemos afirmar com toda a certeza, que a relação entre salários baixos no setor de turismo e o pilar da sustentabilidade social é clara. A falta de salários justos pode ter um impacto negativo direto na qualidade de vida dos trabalhadores, na segurança e saúde no trabalho e na comunidade local. Para garantir que o setor de turismo seja sustentável em todos os aspetos, os salários justos devem ser um aspeto importante a ser considerado. É responsabilidade dos governos, empregadores e viajantes (turistas ou excursionistas) garantir que o turismo seja uma indústria que beneficie todos os envolvidos, obedecendo aos 17 ODS das Nações Unidas, para o Desenvolvimento Sustentável, a começar desde logo pelo 8º.