Operadores de cruzeiros estão a apostar no verão, diz Eduardo Cabrita
A indústria dos cruzeiros foi das mais afetadas pela pandemia mas está a recuperar bem, apesar da incerteza gerada pela guerra na Ucrânia. Na primeira parte da entrevista a Eduardo Cabrita, diretor-geral da MSC Cruzeiros Portugal, está em análise o atual momento desta indústria.
Hoje, o que se passa nos cruzeiros não é muito diferente do que está a acontecer noutros setores do turismo?
É igual, ou muito parecido. Os cruzeiros foram os primeiros a parar, mas por vontade própria porque todos os países e todos os governos, quando se deram conta de que existia uma pandemia, olharam primeiro para terra e para todas as pessoas que estavam em terra e só depois é que olharam para o mar. Na verdade, se não fossem os cruzeiros a parar quando isto aconteceu, e friso que o fizeram voluntariamente, dificilmente se poderiam ter repatriado todas as pessoas na altura porque todos os navios arranjaram portos para repatriar quando as fronteiras estavam a fechar-se. Tendo sido os primeiros a parar, somos também os últimos a recomeçar porque, mais uma vez, os governos pensam nas fronteiras terrestres e só depois nas fronteiras marítimas. Isto apesar de Portugal, tanto no aspeto de legislação e de pensamento do Ministério da Saúde, e das fronteiras, tem tido o aéreo e o marítimo muito alinhados, o que é de saudar – mas houve países em que não foi assim, em que foram sempre colocados outro tipo de entraves às fronteiras marítimas.
Mas a MSC já tem toda a sua frota a navegar?
Neste momento, a MSC tem praticamente toda a frota no mar, no início de maio teremos os 19 navios a navegar mas passaram dois anos, e o primeiro navio que começou a operar após março de 2020, foi em agosto. Fomos os primeiros a colocar um navio a navegar, depois de os experts terem desenvolvido os protocolos, mas até dezembro de 2020 só tivemos dois navios em operação. Depois houve o inverno na Europa e recomeçámos em finais de março, com mais navios. Tudo estava a correr da melhor forma no final de janeiro – os dois primeiros meses deste ano foram tão bons, em termos de reservas, como 2019, só que entes do final de fevereiro fomos confrontados com a guerra na Ucrânia, que fez com que as reservas ficassem mais mornas. Desde o dia 23 de fevereiro, ou poucos dias depois, até há cerca de uma semana e meia ou duas, tudo ficou muito mais suave. Felizmente, agora as reservas retomaram.
Estamos a aproximar-nos do verão e percebe-se que as pessoas estão a ficar um bocadinho cansadas das notícias da televisão, pelo que acredito que comecem a ter predisposição para reiniciarem a marcação de férias, embora a carteira das pessoas, neste momento, não seja aquela que poderíamos pensar antes de ter começado a guerra.
Aquilo que se pensava era que durante os dois anos de pandemia as pessoas tinham poupado algum dinheiro e iriam aplicá-lo nas férias mas possivelmente agora iremos ter alguma dificuldade em atingir, para este verão, o mesmo número de bookings que tínhamos em 2019. Penso que será o próximo mês, mês e meio, a ditar como irá ser o verão.
Todos os operadores de cruzeiros estão a apostar muito no verão, portanto, os dados estão lançados.
Idade dos turistas de cruzeiros não preocupa a MSC
Há quem diga que os cruzeiros, nomeadamente nos EUA, poderão ser prejudicados pelo facto de as pessoas com mais idade não estarem, para já a aderir este tipo de produto. Sente-se isso?
No caso da MSC, dificilmente se notará esse impacto. Na pré-pandemia, o que tínhamos ao nível das faixas etárias dos nossos passageiros era muito equitativo. Cerca de 30% a 35% eram casais com filhos, outros cerca de 30% eram casais sem filhos, mais ou menos maduros, e depois teríamos vinte e poucos por cento de casais e singulares com mais de 65 anos – o que sobra são os singles, espalhados um pouco por todas as faixas.
O sentimento que temos agora, perante as reservas de 2022, é que estas percentagens apenas se alteram em cerca de 1%, o que não é significativo. Não sei se será simplesmente uma questão de informação por país ou se terá a ver com a forma como a pandemia foi tratada na Europa e nos EUA, ou ainda se estará ligado ao facto de nos Estados Unidos as pessoas que fazem cruzeiros terem mais idade. Acredito que também tenha um pouco a ver com o sentimento que foi sendo transmitido, ou por parte das companhias ou mesmo por parte dos governos – e nos Estados Unidos a CDC foi muito mais castradora em relação ao setor dos cruzeiros do que foi a Europa. Seja pelo que for, o que notamos é que a confiança está mais instalada na Europa do que nos Estados Unidos.
“(…) nos Estados Unidos a CDC foi muito mais castradora em relação ao setor dos cruzeiros do que foi a Europa. Seja pelo que for, o que notamos é que a confiança está mais instalada na Europa do que nos Estados Unidos”
O que é que as grandes companhias de cruzeiros como a MSC identificam neste momento como constrangimentos à vossa atividade?
O sentimento que nós temos é que, se a guerra entre a Rússia e a Ucrânia não tivesse começado, a parte da pandemia estava praticamente ultrapassada.
A Europa toda, ou quase toda, já disse que as regras para este ano, relacionadas com as fronteiras marítimas, poderão deixar de existir, ou seja, todas as imposições ao nível de excursões deixarão de existir, embora possa haver um ou outro país que exija, à entrada, um teste antigénio – penso que PCR já ninguém vai exigir -, pelo que não vejo que a pandemia possa, este ano, ter a influência negativa que teve nos últimos dois anos. Mas se a condição de saúde não deverá ter impacto, já a condição económica poderá ter, especialmente na Europa. Esta poderá ser uma diferença que leve os Estados Unidos a recuperarem mais facilmente o mesmo patamar de 2019.
Os preços dos cruzeiros que estão a ser lançados para este ano são mais elevados?
Enquanto os anos de 2020 e 2021 foram completamente disruptivos, para 2022 tínhamos decidido voltar ao conceito de revenue management porque sentíamos que havia confiança e disponibilidade por parte dos clientes. Começámos em outubro do ano passado com preços relativamente baixos quando comparados com 2019 para, à medida que as vendas fossem subindo, os podermos vir a subir também. Até agora não os estamos a aumentar em flecha porque o número de bookings não está ao nível de 2019 mas já subimos ligeiramente os preços e estamos a cumprir os orçamentos.
Como é que está a reagir o mercado nacional?
Até à guerra, notámos que todos os países estavam a funcionar da mesma forma, com um fevereiro que foi extraordinário. Quando começou a guerra, a Europa ficou mais normal em termos de bookings e agora estamos de novo a subir. Por isso estamos esperançados em que venhamos a ter um bom verão – o que pode acontecer é que seja um verão muito mais trabalhoso porque vai ser muito mais concentrado em dois meses.
Amanhã no Turisver.pt pode ler a segunda parte da entrevista com Eduardo Cabrita, diretor-geral da MSC Cruzeiros Portugal, onde são abordados os temas:
- Mercado nacional
- Cruzeiros “portugueses”
- Investimentos em frota
- Expansão da MSC Cruzeiros