Luís Rego quer ver as autoridades a combaterem o mercado paralelo de rent-a-car nos Açores
À margem do Encontro Regional de Turismo dos Açores, que decorreu na ilha de Santa Maria, o Turisver falou com Luís Rego, diretor do Grupo Ilha Verde para saber como tem sido o desempenho do rent-a-car no arquipélago, que desafios enfrenta e que perspetivas se abem para o próximo ano. Em “cima da mesa” estiveram também temas como a sustentabilidade e a SATA.
Lembro-me que quando falámos em março, na BTL, disse-me que estava ligeiramente otimista. Hoje qual é a sua opinião sobre o ano turístico?
No início do ano, pelos contactos que íamos fazendo e o feedback que íamos recebendo, as perspetivas eram de que 2022 seria um bom ano mas havia ainda alguma incerteza. As perspetivas vieram a confirmar-se, acabámos por ter um ano muito bom, acima daquilo que eram as nossas expectativas iniciais, motivado pelo ambiente pós-pandemia e a vontade das pessoas em viajarem.
De acordo com as estatísticas, a primavera e o início do verão foram muito bons ao nível do mercado nacional para os Açores, mas de julho a setembro o mercado nacional caiu, enquanto o internacional subiu muito. Os operadores nacionais queixam-se de que houve falta de quartos para poderem responder aos portugueses. Esta é a sua leitura?
É. De uma forma geral, 50% dos turistas dos açores são mercado nacional, mais acentuado no pico do verão mas este ano houve uma maior presença de estrangeiros, mesmo no período que coincide com as férias dos portugueses, o que foi também motivado pelo aumento do fluxo de voos de alguns países, nomeadamente dos Estados Unidos, mas também pela retoma de voos de companhias de bandeira do Reino Unido, da Alemanha e de Espanha e com o voo da SATA desde Paris. Houve aqui um aumento de fluxos de alguns mercados que já trabalhávamos mas não com voos diretos, e isso motivou a dificuldade de alguns operadores nacionais encontrarem disponibilidade em alguns períodos do ano. O facto de os portugueses marcarem as férias mais em cima da hora também levou a isso.
Sentiu que estes fluxos foram transversais ou sentiram-se mais em algumas ilhas?
Acabou por ser transversal porque apesar de os voos diretos virem para São Miguel e para a ilha Terceira, grande parte do fluxo é depois derramado pelas outras ilhas e nós sentimos isso de forma transversal, embora mais numas ilhas do que noutras, em função das suas características e da própria oferta.
A frota de carros para alugar ainda está abaixo de 2019
Já conseguiram compor a vossa frota a um nível idêntico ao de 2019?
Não. Em 2022 conseguimos recuperar relativamente ao no passado ao nível da oferta, o que foi importante porque a procura também aumentou, mas não conseguimos retomar os níveis de 2019, estamos ainda 30 a 40% abaixo. Não conseguimos pelas dificuldades ao nível da frota disponível que as marcas disponibilizaram e tivemos que nos adaptar. De uma forma geral, tivemos frota suficiente para fazer face à procura embora houvesse períodos de maior dificuldade, nomeadamente de 15 de julho ao final de agosto. A grande dificuldade foi colocada pelos clientes que reservaram mais em cima da hora e principalmente ao nível das viaturas mais económicas. Quanto às reservas que eram feitas com alguma antecedência, fomos sempre dando resposta.
O preço do aluguer foi muito inflacionado?
Não. Posso dizer que comparativamente a 2021 não houve grandes diferenças porque no verão do ano passado já tinha havido alguma retoma, constituída por uma procura muito em cima da hora e os preços foram reajustados face à procura. Este ano houve um ligeiro aumento mas a maior diferença foi de 2019 para 2021, em 2022 houve uma ligeira correção face aos custos e à inflação.
Havia a perspetiva de uma introdução gradual de carros elétricos. Houve alguma evolução?
Vamos sempre introduzindo novos automóveis e aumentámos um pouco os elétricos mas não muito. Isto tem a ver com o compromisso que tínhamos já em 2019 com o Governo, ao nível da cartilha da sustentabilidade, de introduzir na nossa frota um determinado número de viaturas elétricas e temos vindo a cumprir. Continuamos a sentir dificuldade em aumentar muito mais porque não existem infraestruturas suficientes em todas as ilhas, nomeadamente em São Miguel. Há muitos turistas que não se importam de contribuir para a sustentabilidade, principalmente num destino como os Açores, mas não estão reunidas as condições para ter mais veículos elétricos – o Governo tem que aumentar as infraestruturas necessárias para nós podermos crescer neste tipo de oferta.
Alguns rent-a-car têm estendido a sua oferta para outros tipos de mobilidade que não apenas o automóvel. Vocês ainda não têm essa extensão de produto?
Vai aparecer naturalmente. O que nós oferecemos é meios de mobilidade aos clientes, neste momento, pelo menos ao nível da nossa empresa, estamos limitados ao automóvel, o que não significa que dentro de pouco tempo não possamos diversificar a oferta, como bicicletas e motos já com as novas tendências que é o produto elétrico. Mas da nossa parte temos como objetivo, dentro de pouco tempo, poder oferecer esse tipo de produto.
“Nos Açores há empresas de rent-a-car para todos os gostos mas começa também a aparecer algum mercado paralelo que é importante combater e esse papel cabe às autoridades”
A Ilha Verde é líder de mercado nos Açores. A concorrência tem um bom comportamento, no geral?
Há vários níveis de concorrência, vários níveis de oferta, empresas que se dedicam oferecer um serviço de maior qualidade, outras menos, o que se traduz no preço praticado. No rent-a-car não existe a classificação que existe nos hotéis, mas os clientes acabam por identificar quem oferece qualidade e procuram a empresa que lhes oferece mais confiança e lhes pode garantir melhor serviço, independentemente do preço porque na nossa atividade o preço não é tudo e o turista dos Açores é um cliente médio-alto e procura alguma qualidade.
Nos Açores há empresas de rent-a-car para todos os gostos mas começa também a aparecer algum mercado paralelo que é importante combater e esse papel cabe às autoridades. A pandemia e a dificuldade em termos produto também veio contribuir para o aumento do mercado paralelo, o que é mau para um destino que tem o objetivo de oferecer um serviço de excelência em todas as áreas.
Qual é a sua perspetiva relativamente ao próximo ano?
A minha perspetiva é ter um ano muito idêntico a 2022, com as mesmas dificuldades ao nível da obtenção de viaturas. As nossas viaturas para este ano foram encomendadas logo no início do ano, algumas no final de 2021 e mesmo assim fomos confrontados com a dificuldade de as viaturas não virem a tempo e horas, tanto que neste momento estamos a receber algumas que devíamos ter recebido antes do verão. Isto exige que façamos um planeamento ainda mais antecipado. Ainda não sabemos que ano vamos ter e já temos que tomar decisões sem saber qual vai ser a nossa realidade. É um desafio maior que significa também maiores riscos.
Este ano começou com muitas indecisões ao nível da organização turística nos Açores. As coisas foram ficando clarificadas durante o ano ou ainda não sabem bem o que vai acontecer num futuro próximo?
Ainda há muita coisa indefinida no que diz respeito à oferta e ao produto, há reajustes, há alguns planos estratégicos e de ordenamento do território e de capacidade que estão ainda a ser elaborados e postos à discussão, ou seja, há metas e objetivos que estão ainda por clarificar.
No entanto, a promoção continua, os objetivos estão traçados, calculamos que vão ser concretizados mas poderá não ser suficiente, precisamos de mais promoção, de mais apoio, de mais orçamento, para fazer face ao que é necessário porque há destinos concorrentes que fazem apostas muito fortes e nós temos que corresponder e estar ao esmo nível.
Apesar de alguma indefinição, sentimos de alguma forma, que as situações estão a desenvolver-se e que as coisas estão a rolar no sentido de alcançarmos os nossos objetivos.
Vital mesmo é o transporte aéreo, que este ano teve um comportamento melhor. E a SATA tem feito um bom papel?
O transporte aéreo é tão importante para nós como o ar que respiramos. Sem transporte aéreo não há turismo na região. Durante muitos anos andámos a tentar perceber como é que se desenvolvia o turismo nos Açores e hoje chegámos à conclusão de que mais importante que ter um operador ou um agente de viagens é ter o voo até porque sem ele os próprios agentes de viagens não conseguem vender.
A SATA sempre teve um papel fundamental no desenvolvimento turístico da região e durante muitos anos era o meio que a região podia usar na captação de fluxos. Claro que isso teve custos acrescidos, sacrificámos a sua saúde financeira mas era o único mio que tínhamos para poder ir buscar os mercados que interessavam. Hoje há uma maior oferta mas a SATA continua a ter um papel fundamental na distribuição interna e na captação de alguns mercados mas, evidentemente, não pode chegar a todos.
Um pouco motivado pela pandemia, havia companhias com aviões disponíveis para irem em busca de novos mercados e isso aconteceu com os Açores. Como disse, regressaram companhias como a British Airways, a Lufthansa, a Iberia, que estão a marcar a sua posição e a contribuir também para o desenvolvimento dos Açores.
*O Turisver deslocou-se à ilha de Santa Maria com o apoio da Azores Airlines e da Bestravel