Luís Rego quer Governo açoriano a usar PRR para apoiar eletrificação das frotas
O rent-a-car, nos Açores, depende quase exclusivamente do turismo, pelo que os últimos dois anos foram de grandes dificuldades para a Ilha Verde que recuou “a níveis de há 30 anos”. Mas o seu diretor, Luís Rego, tem confiança no futuro e na atração dos Açores enquanto destino sustentável, embora afirme que há que fazer muito mais.
Como é que a Ilha Verde ultrapassou estes dois últimos anos?
Ultrapassou com uma dificuldade que foi comum a todos, com uma queda brutal da faturação, com uma quebra inesperada para todos nós. Nos Açores, em especial, este setor e o turismo em geral, atingiu quebras superiores a 85%, houve meses em que tivemos mais de 90% de quebra porque quem aluga carros é quem nos visita, não temos um mercado local corporate que possa equilibrar alguma falta de turismo. Portanto, foi com grande dificuldade que ultrapassámos estes dois anos, acima de tudo porque fomos incentivados, como não podia deixar de ser – e foi o que fizemos, com a responsabilidade que nos era devida – a manter toda a estrutura e os nossos quadros de trabalho, o que ainda nos onerou mais.
Felizmente, conseguimos enfrentar esta crise, que ainda não está sanada, mas com o esforço e a compreensão de todos, estamos certos que nos próximos anos conseguiremos equilibrar as nossas contas. Com esta pandemia, a nossa faturação e o nosso negócio recuou a níveis de há 30 anos, com a estrutura atual.
Além disso, tivemos outra dificuldade que afetou muitas empresas do nosso setor, pelo menos com as características e dimensão da nossa, que foi a dupla penalização em termos fiscais, já que nos vimos, durante alguns meses, impedidos de receber os apoios fiscais que foram atribuídos a todo o setor em termos do layoff. Isto porque, face à situação em que estávamos, o único caminho que tínhamos era reduzir a nossa frota e fomos confrontados com a impossibilidade de receber esses apoios porque a venda das viaturas era integrada na faturação da empresa. Isto fez com que não atingíssemos a quebra que estávamos a ter com os alugueres, que se situava nos 85%, o que nos impediu de aceder aos apoios do layoff.
Fizemos alguns apelos junto do governo para que se conseguisse ultrapassar esta situação neste setor, permitindo-nos separar a parte dos serviços da que era referente às vendas das viaturas mas sem resultado.
A determinada altura, a ideia que passava aqui no Continente era a de que os Açores estavam a fechar-se sobre si mesmo mais do que deviam, dificultando em demasia a entrada de turistas. Foi isso que aconteceu?
A dada altura, de forma a controlar a pandemia e por via da dificuldade em termos da capacidade de resposta em termos dos serviços de saúde, isso terá acontecido, mas penso que foi o mais acertado a fazer, apesar de se ter achado estranho. Claro que isso contribuiu ainda mais para a quebra do nosso negócio e do turismo e geral.
Mercado nacional fundamental neste início da recuperação
Em 2021 já se sentiu alguma esperança em termos de possibilidades de recuperação?
Em 2020 parecia que nos tinha caído tudo em cima, foi tudo inesperado e desconhecido. Em junho ainda ninguém sabia o que é que se ia passar, mas foi também um período de que retirámos ensinamentos e um deles foi termos entendido que, ultrapassada a pandemia, rapidamente poderíamos começar a crescer, paulatinamente e isso fez-nos recuperar alguma confiança em 2021 e começar a encarar 2022 de outra forma. Digamos que em 2021 começámos a ganhar confiança e isso foi muito importante. Claro que até nos reequilibrarmos ainda vai levar tempo porque, primeiro, tínhamos carros e não tínhamos clientes, depois tínhamos clientes mas não tínhamos carros. Espero que no próximo ano possamos ter carros e ter clientes.
Agora, estamos a passar por outro problema difícil de entender, que é a guerra na Ucrânia. Ainda não eliminámos o problema da pandemia e já temos outro, o que nos atrasa a recuperação efetiva.
O turismo em 2021 foi muito suportado pelo turismo do Continente. Este ano já está a ser diferente?
Em 2021 cerca de 90% do turismo que tivemos foi mercado nacional porque, conscientes dos riscos que corriam, a opção dos portugueses foi viajar internamente e ir aos Açores dá uma sensação de que se vai para fora do país, ficando cá dentro. Além disso, notava-se que as pessoas procuravam um destino de natureza, sem grandes riscos, e é isso que os Açores oferecem. Muitos dos que foram pela primeira vez, tiveram uma surpresa agradável e querem repetir a experiência, o que é muito bom para os Açores. Em contrapartida, o mercado estrangeiro foi muito pouco em 2021.
Este ano, o que se verifica é que o mercado nacional mantém a sua cadência de crescimento para atingir o seu espaço natural que, em contas redondas, anda em torno dos 50%, e assistimos à recuperação dos mercados internacionais, basta ver o número de voos que estão programados, o que se deve em muito ao trabalho da ATA e também às características próprias de um destino como os Açores. Hoje temos voos diretos dos Estados Unidos, de Espanha, de França, de Inglaterra, o que antes não acontecia. Pode dizer-se que a nossa capacidade de oferta de voos está, em média, 15% acima do que era em 2019, o que mostra, claramente, a recuperação do mercado internacional.
O preço dos combustíveis e as frotas de carros elétricos
Num momento em que ainda não estão sanados os problemas resultantes da pandemia, surge outro problema que afeta, em muito, a atividade das empresas de rent-a-car, que é o preço dos combustíveis. Isso pode ter um efeito negativo sobre a procura?
O preço dos combustíveis tem um efeito direto e outro indireto. Estamos a assistir ao aumento do custo das viaturas que tem como consequência o valor da diária dos alugueres, que também já aconteceu o ano passado. O preço dos combustíveis poderá influenciar, na medida em que os clientes podem querer optar por viaturas de menor consumo para compensar o que pagam a mais no aluguer mas penso que isso não será muito penalizador.
O que vai ser mais penalizador para a nossa atividade é aquilo a que estamos já a assistir, que é a dificuldade em adquirir viaturas para repormos os níveis de frota de que necessitamos.
As preocupações ambientais estão na ordem do dia. Já sentem muito a preocupação dos vossos clientes em termos, por exemplo, de querem alugar carros elétricos?
Na nossa empresa adquirimos alguns carros elétricos, para dar cumprimento ao compromisso que assumimos com o Governo e com a Região, no seguimento do desafio que foi lançado no âmbito da cartilha da sustentabilidade. Percebemos que a sustentabilidade e tudo o que a ela se liga, como a economia verde e a economia circular, tem em vista a preservação da nossa região e é também um fator de diferenciação face a outros destinos.
Estamos a sentir uma preocupação crescente por parte das pessoas que, inclusive, não se importam de pagar mais para ter esse tipo de produto. No entanto, de momento não estão reunidas as condições, num destino como o nosso, para eletrificarmos as nossas frotas e isso, mais do que uma necessidade é uma exigência, até do ponto de vista da imagem da região e da expectativa do turista que vem aos Açores que procura aquilo que oferecemos em termos de sustentabilidade. Se os Açores são um destino sustentável, o que é que oferecemos, na prática, em matéria de sustentabilidade? O verde e a paisagem não são suficientes. Nós estamos prontos para ir mais além, mas não o conseguimos fazer sem apoios.
Deixo um repto ao Governo para que olhe para esta realidade de uma forma diferente porque, por nós próprios, sem apoios, temos dificuldades em conseguir eletrificar nossas frotas. Agora, com os apoios do PRR que o país vai receber, e a região em particular, deveria reunir-se um conjunto de apoios que nos permitisse a eletrificação das frotas. E não se trata apenas das frotas: neste momento também ainda não existe uma rede que permita o carregamento das viaturas. A maioria dos nossos parques não está preparada, muitos dos hotéis também não.