“Este vai ser talvez o melhor verão de sempre” afirma Marcos Sousa
NAU Salgados Palace e NAU Salgados Palm Village, dois hotéis que têm realidades diferentes. Na Herdade dos Salgados, em terras algarvias, a escassos metros um do outro, têm como diretor-geral, desde 2013, Marcos Sousa, que falou ao Turisver de ambas as unidades.
Depois de um ano como 2019 que tinha sido o melhor ano turístico de sempre, de repente parou tudo. Qual foi a sensação que se viveu nessa altura?
Quando pensamos em 2020, recordamos que entrámos o ano com os meses de janeiro e fevereiro a terem números muito interessantes, muito acima dos outros anos, pelo que 2020 prometia muito. Em março, aqui no Salgados Palace, recebemos o Campeonato Europeu de Snooker e projetava-se um ano muito bom. A competição terminou já quase com lockdown e a seguir foi toda a gente para casa. O processo foi complicado porque um ano que prometia ser maravilhoso transformou-se numa enorme incerteza que penso que ainda hoje condiciona muito a parte psicológica das pessoas.
Nós fomos o grupo que abriu os hotéis mais cedo, primeiro os dois hotéis São Rafael Atlântico e o Salgados Dunas Suites, com uma operação de luxemburgueses e depois abrimos o Salgados Palace e o Salgados Palm Village. Fizemos um investimento para transformar alguns apartamentos em self-catering pensando que seria a melhor aposta porque se pensava que as pessoas não queriam ajuntamentos e o que senti foi exatamente o oposto: é verdade que queriam algum distanciamento mas depois da pandemia o que queriam mesmo era o Tudo Incluído. Isto fez com que a nossa época alta, quer de 2020 quer de 2021, tenha sido fantástica. Crescemos muito em preço médio, descemos consideravelmente em ocupação, principalmente em 2020 porque havia um limite máximo de pessoas que podíamos receber nos hotéis, não em função dos quartos mas do distanciamento na restauração e em 2021 ficámos cerca de 5% abaixo de 2019. Isto porque tivemos consideravelmente menor do que em 2019 mas com um preço médio muito mais elevado.
Temos vindo a apostar na qualidade e no preço e este ano o preço vai subir mais de dois dígitos em praticamente todos os meses. Este crescimento dos preços dá para colmatar a subida dos custos, da despesa e a natural necessidade de irmos aumentando os preços de venda. De acordo com os indicadores de reservas e preços que já temos, este ano vamos, claramente, superar os números de 2019.
Na reabertura tiveram que implementar toda uma logística nova, nomeadamente em termos dos restaurantes?
Alterámos a forma de servir as refeições, tivemos que colocar baias à volta do buffet e entre as baias e o buffet colocámos cozinheiros e empregados a fazerem o empratamento da comida para o cliente levar, e todos estavam de luvas e máscara. Esta foi a logística de 2020 porque nas áreas interiores havia a necessidade de manter distanciamento. Uma nota curiosa é que este serviço de empratados, nos seis restaurantes que temos nos dois hotéis que giro, cinco deles a funcionarem em regime de buffet, custou-nos, em 2020, perto de meio milhão de euros, pelo elevado número de funcionários que foi necessário ter ao serviço.
Nas áreas exteriores, nas piscinas, também havia que respeitar uma distância mínima entre as espreguiçadeiras mas a verdade é que as pessoas não queriam saber disso e dentro de água muto menos.
Em 2021 alterámos o método e embora tivéssemos mantido as baias, os hóspedes puderam começar a servir-se, tendo que respeitar um circuito de entrada e de saída e sendo obrigatório que desinfetassem as mãos. Já este ano voltámos à normalidade de 2019 e termos do serviço, sendo que agora já nem é necessário usar máscara.
Dois hotéis, duas realidades diferentes
Como diretor do Salgados Palace e do Salgados Palm Village, qual é o que lhe dá mais “dores de cabeça”?
São hotéis muito diferentes e direcionados a procuras também diferentes por parte dos clientes. Quem procura um hotel no sentido mais clássico do termo, prefere o Salgados Palace, se quer algo com estilo mais de resort, naturalmente fica no Palm Village. Os dois dão “dores de cabeça” por motivos diferentes, o Salgados Palace pela expectativa que cria o facto de ter cinco estrelas à porta e um pé direito de receção com 20m de altura que reflete imponência logo à chegada, levando as pessoas a pensar que todo o hotel tem esta grandeza. Com o Salgados Palm Village é exatamente ao contrário, encontramos uma receção pequenina à entrada mas depois temos muito espaço ao ar livre, vários restaurantes com luz natura e onde tudo acontece ao ar livre.
Durante o período de congressos, o Salgados Palace é mais exigente porque o próprio segmento MICE também o é, já no lazer depende muito da tipologia dos mercados que predominam: nas pontas são mais ingleses e outros mercados internacionais, no verão é principalmente o cliente nacional e eu não estou de acordo em que o cliente português seja mais problemático, aliás temos clientes que estão connosco desde 2013, o que reflete bem a confiança que depositam em nós.
Quando fala do Salgados Palace, refere sempre o Centro de Congressos mas, curiosamente, não faz referência ao campo de golfe. Porquê?
A realidade do Salgados Palace é uma realidade mais MICE e menos golfe. É um hotel muto grande – curiosamente quando chegámos chamava-se Salgados Grande Hotel – e não é um hotel típico de golfe nem tem as facilidades que os golfistas normalmente procuram, apesar de ser walking distance. Por outro lado, temos muitos eventos que inviabilizam as estadias de cinco ou sete noites porque as épocas de ambos os segmentos acabam por se sobrepor, o que faz com que os golfistas não tenham “janela” para reservar o Palace. Os contratos de golfe que temos feito são para o Palm Village, onde este ano, até 15 de junho vamos ter muitos clientes do golfe, recomeçando depois a 15 de setembro indo até 15 de novembro.
Mantém-se também a distinção entre os dois hotéis ao nível de mercados, no Palace mais clientes nacionais, no Palm Village mais estrangeiros?
O Salgados Palace funciona muito para grupos, acima de tudo funciona para MICE de 1 de outubro até 31 de maio, impossibilitando muito o cliente individual. Pelo contrário, o Salgados Palm Village funciona em regime de Tudo Incluído de 1 de março até 15 de novembro, estando dedicado ao segmento de lazer e ao segmento de golfe, funcionando para MICE apenas como complemento do Palace, o que leva a que tenha muito mais possibilidade de ter clientes estrangeiros. Quando o Palace abre para o segmento de lazer, de junho a setembro, é quando o mercado nacional está em alta. Temos muito mercado espanhol, mercado inglês e um pouco de francês, mas com muito menos expressão.
Relação do Grupo NAU com o mercado interno fortaleceu-se
Para o verão começa já a ser difícil reservar?
Na minha opinião, este vai ser, talvez, o melhor verão de sempre, especificamente de junho a setembro. Temos várias datas já sem disponibilidade, como acontece a partir de meados de Julho até meio de agosto. Nos últimos dias temos tido muita procura para os últimos dias de Julho, altura em que termina o período escolar e estamos muito acima, em termos de forecast, do que tínhamos à mesma data de 2019.
É importante deixar uma nota sobre o fortalecimento das relações entre o Grupo NAU e o mercado nacional que aconteceu nos dois últimos anos, nomeadamente no que toca ao Salgados Palace e ao Salgados Palm Village. O grupo teve abertas praticamente todas as suas unidades nestes dois anos, em 2020 só não reabrimos uma, o que nos levou a fazer campanhas publicitárias específicas para o mercado nacional e para os agentes de viagens portugueses, ou seja, estivemos abertos para o mercado nacional e é por isso que este ano estamos muito fortes ao nível do mercado interno. A diferença é que este ano o mercado internacional está a crescer, o que nos ajuda a ter maior volume de reservas.
Resumindo, temos algumas datas já fechadas mas ainda temos muita disponibilidade noutras.
A “dor de cabeça” neste momento já não é a falta de clientes mas é a falta de quem trabalhe para esses clientes?
É verdade. Este é um problema de que se vem falando desde 2018 mas devia ter-se falado muito mais porque é um tema que tem que se definir como estratégico para o país. Durante os últimos anos tem-se assistido a uma alteração grande ao nível do mercado de trabalho e a pandemia agravou a situação já que levou a que muitos hotéis não abrissem, pelo menos em 2020, e as pessoas acabaram por sair do setor, em alguns dos casos porque como não havia turistas e as unidades não abriam, acabaram por dispensar os colaboradores que tinham.
Em 2021, o Algarve funcionou bem no verão mas no inverno voltámos todos para casa e mais gente foi dispensada. Ou seja, nestes últimos três anos, as pessoas andam a trabalhar “às pinguinhas” – trabalham um quadrimestre ou um semestre e depois vão para casa e isso não é vida para ninguém.
A pandemia levou a que as pessoas pensassem mais no futuro, e quando agora tentamos ir buscar as pessoas que estavam a trabalhar nos hotéis elas já estão em outras áreas. As pessoas encontraram emprego noutras áreas que lhes proporcionam horários administrativos e um ano inteiro de atividade. Não falo de salários porque acho que esta não é a questão base, a grande questão, quanto a mim, é mesmo a duração dos contratos, a estabilidade que as pessoas têm nas suas vidas, e as pessoas podem até optar por profissões onde ganham menos mas não trabalham “às pinguinhas”.
É importante fazer uma alteração de fundo, mesmo ao nível da formação, até porque as gerações mudaram. Hoje, os jovens mudam muito mais de emprego, de região, até de país e, como as coisas estão, sinto que a hotelaria será, cada vez mais, uma indústria de passagem – não acredito que as pessoas venham para fazer carreira e ficarem durante 10, 20 ou 30 anos como antes acontecia.