Diretor-geral da Sonhando: Maior agressividade no mercado deve-se a mais oferta e à entrada de Fernando Bandrés

O novo posicionamento da Sonhando no mercado, marcado por uma maior aproximação às agências de viagens, foi o tema com que iniciámos a segunda parte da entrevista a José Manuel Antunes. A programação para o fim do ano, a TAP e a problemática do Aeroporto de Lisboa, foram outros temas abordados com o diretor-geral do operador turístico Sonhando.
Uma das coisas que é muito notada é que neste período da pós-pandemia a Sonhando criou uma agressividade positiva para estar cada vez mais próximo dos agentes de viagens. Isso tem a ver com o facto de terem mais oferta no mercado?
Claro que a circunstância de termos mais oferta no mercado é importante mas o facto de ter o Fernando Bandrés ao meu lado desde julho do ano passado tem sido muito importante porque as pessoas não chegam a todo o lado e eu sozinho não o conseguia fazer. Isso deu-nos uma capacidade completamente diferente de estarmos junto do mercado.
Sempre considerei o Fernando Bandrés um grande profissional, honesto, trabalhador, sempre disse que gostaria de o ter a trabalhar comigo, mas o facto é que ele conseguiu superar todas as minhas expectativas. Essa nossa maior presença no mercado tem muito do mérito dele. O Fernando tem sido o grande complemento que nos faltava na Sonhando.
Também têm conseguido parcerias e contratos muito especiais com agrupamentos e marcas importantes do mercado, nomeadamente com a Viagens El Corte Inglés?
Não é a primeira vez que isso acontece mas agora essa parceria foi mais aprofundada, o que tem também a ver com a personalidade do atual diretor das Viagens El Corte Inglês, o Ricardo Cardia. Tínhamos contratos que eram amorfos e hoje, devido à facilidade que temos de negociar com ele e à vontade que ele teve, temos uma relação muito mais profunda.
As parcerias que têm vindo a fazer vão muito além da mera comissão?
Sem dúvida, é uma nova forma de estar no mercado e isso também tem muito a ver com o facto de o Fernando Bandrés estar connosco. Temos feito, organizados pelo Fernando Bandrés, uma série de webinars dedicados a vários destinos e isso tem-nos ajudado a chegar com o nosso produto ao mercado de uma forma mais incisiva.
Também se abriram a colaborar em campanhas dos agrupamentos?
Sempre estivemos abertos mas talvez estejamos agora a acompanhar um bocadinho mais aquilo que eu considero as ‘loucuras’ da nossa concorrência.
A Sonhando tem aproveitado todas as oportunidades de negócio em especial na época baixa
Vocês têm vindo a aproveitar oportunidades e períodos de época baixa para fazerem alguns voos especiais, como é o caso dos charters para acompanhamento do Benfica na Champions mas também aproveitaram para fazer um negócio com a Federação de Futebol de Cabo Verde…
Como é conhecido tenho algumas relações de amizade com pessoas do mundo do futebol e tenho uma relação de amizade forte com o presidente da Federação de Futebol de Cabo Verde e eles estavam com problemas para levar a seleção de Cabo Verde à África do Sul e eu arranjei uma solução. Eles ficaram muito felizes e, como consequência disso, já tivemos pedidos de outras Federações africanas para voos futuros.
Ponho sempre muito carinho nestas situações, tanto que acompanhei a deslocação de princípio a fim, estive na África do Sul com eles, assisti ao jogo e por amizade e respeito para com o cliente até vesti as cores de Cabo Verde.
Em 2020, quando começou a pandemia, pensei que ia acabar o turismo mas depois pensei que as pessoas precisavam de ser repatriadas e fizemos um negócio que começou com a Guiné – fizemos dois voos que correram muito bem. A seguir fizemos os de Angola e depois Timor, onde pusemos sete milhões de euros de risco em 14 operações. Em relação às equipas de futebol de África é um bocado assim.
Na verdade, estou sempre a ver novas oportunidades, seja de destinos, seja de outro tipo de negócios. Essa foi sempre a minha forma de estar, por isso ao longo dos anos lancei destinos como Cartagena das Índias, Aruba, Porlamar na Venezuela… Trata-se de pensar para a frente, de estar sempre a tentar inovar.
Cada vez mais os operadores programam com antecipação. Para o fim de ano, já está alguma coisa programada?
As apostas em charter vão ser as do costume: Madeira e Brasil. Claro que se houver oportunidade poderemos introduzir mais algum destino mas os riscos são muito grandes.
Nós fazemos a operação de fim de ano para o Brasil porque temos a contrapartida do mercado brasileiro que viaja para passar o ano em Portugal e viabiliza economicamente a operação. Para a Madeira, os preços dos voos regulares naquela época são de tal forma elevados que nós conseguimos fazer os charters a preços caros mas dentro do preço de mercado. Fazer qualquer outro destino no fim de ano sem retorno de turistas é muito difícil. Por exemplo, Zanzibar está completamente fora de questão porque não vai haver tanzanianos que venham a Portugal fazer a passagem de ano para preencher o voo de regresso e o avião não pode ficar lá uma semana.
A Sonhando, tal como outros operadores, já está a fazer investimentos largos na compra de camas para o réveillon de 2023-2024. Já estamos a fechar contratos com várias cadeias hoteleiras, com investimentos na ordem das várias dezenas de milhares de euros para podermos ter produto disponível no mercado.
“Quem viaja por todo o mundo como eu viajo, sabe que o Aeroporto de Lisboa é, de longe, o pior de todas as capitais europeias e mesmo a nível mundial, até países de terceiro mundo têm aeroportos com mais capacidade de acolhimentos, de transporte…”
A TAP e o Aeroporto de Lisboa são, nos dias hoje, dois dos maiores problemas dos operadores turísticos e das agências de viagens. Qual é o que mais o preocupa?
Claramente o Aeroporto de Lisboa. O maior travão que Portugal está a ter é a indecisão por culpa da incapacidade dos políticos em resolverem a situação e avançarem com uma solução. Tenho 70 anos e desde criança que ouvia os meus pais a dizerem que o aeroporto ia sair das Portela. Tem-se esbarrado sempre na incapacidade dos políticos em resolverem uma questão que é fundamental para o país – não é só para Lisboa, não é só para o turismo, é para o país.
O aeroporto de Lisboa, tal como está, é pior que uma estação de autocarros em hora de ponta. Quem viaja por todo o mundo como eu viajo, sabe que o Aeroporto de Lisboa é, de longe, o pior de todas as capitais europeias e, mesmo a nível mundial, até países de terceiro mundo têm aeroportos com mais capacidade de acolhimento, de transporte… É uma vergonha nacional e, pior que isso, é o grande travão ao desenvolvimento da nossa economia. Não tivemos capacidade para resolver um problema que todos os países conseguem resolver.
Somos um país periférico e não temos grande capacidade industrial pelo que a nossa grande capacidade de progressão enquanto país continua a ser o turismo e se travarmos a nossa capacidade de receber turistas não conseguiremos progredir.
Eu sou do outgoing não sou do incoming mas isto também nos afeta. Dou um exemplo: tenho um charter para acompanhar o Benfica na deslocação a Milão e por questões de lógica gostava que o voo partisse entre as 07h00 e as 08h00 da manhã e o único slot que estou a conseguir arranjar, por grande favor, é às 10h45, o que faz com que o produto seja um subproduto porque as pessoas não vão ter nenhum tempo em Milão, vão ter que ir a correr para o estádio. Isto porque este aeroporto não consegue resolver as situações.
Mas a TAP é um tema na ordem do dia. Na sua opinião, neste momento, a TAP está a passar pela pior fase da sua vida por causa da política? Há política a mais em torno da companhia aérea?
Há política a mais, sem dúvida, mas não sei se esta será a pior fase da companhia porque a TAP tem estado quase sempre numa má fase. Já vi a TAP mais no fosso do que vejo hoje, o que lamento é que todos os políticos nunca tenham tido a coragem nem a capacidade para resolver os problemas da TAP e que, pelo contrário, tenham sempre complicado.
A TAP é um bem nacional, é uma necessidade nacional, um ícone do país e ver a TAP tão mal tratada a nível de gestão durante décadas é uma coisa que dói a qualquer cidadão português, e provavelmente mais a nós que trabalhamos no turismo. Nos últimos anos, a TAP só ganhou dinheiro à custa de sacrificar aquilo que é essencial, que são os recursos dos trabalhadores, os seus salários e isso vai ter de terminar. Vejo o futuro da TAP com forte preocupação, não gostava que fosse entregue a empresas estrangeiras porque as experiências anteriores têm sido péssimas.
Quando os partidos da oposição dizem que os portugueses andam todos a pagar para a TAP é mais politiquice em cima do assunto?
Sobretudo é demagogia porque nós pagamos para tudo. Este ano isso é mesmo mentira porque a TAP teve resultados positivos. A TAP não é uma empresa de sabonetes, é a empresa que liga Portugal ao mundo e aos portugueses que estão por esse mundo fora, portanto está num patamar especial.
O turismo como um todo devia estar a discutir soluções para a TAP em vez de se limitar a acompanhar circunstancialmente o que se vai passando?
Há uma inércia por parte do turismo, quer relativamente à TAP quer em relação ao Aeroporto, duas coisas que são fundamentais. Devíamos de assumir a responsabilidade de discutir e debater estes temas, de apontar soluções concretas e batermo-nos por elas de forma pública porque é o futuro do país e muito da evolução do nosso turismo que está em causa.
Leia aqui a 1ª parte da entrevista a José Manuel Antunes, diretor-geral do operador turístico Sonhando.