Aldeia da Cuada na ilha das Flores: “Quando o tempo para, mesmo quando o relógio continua a girar”

É considerada, atualmente, pelo Governo Regional dos Açores como Património com interesse cultural, arquitetónico e paisagístico, mas nem sempre teve esse estatuto. A aldeia que nos anos 60 ficou ao abandono, depois de ver os seus poucos mais de 120 habitantes partirem para os Estados Unidos e o Canadá em busca de uma vida melhor, voltou a ganhar vida, quando o casal Teotónia e Carlos Silva decidiu comprar a sua primeira ruína há 36 anos.
Chama-se Aldeia da Cuada, faz parte da freguesia da Fajã Grande, na ilha das Flores, a mais ocidental do arquipélago açoriano e terá sido criada em 1676, mas só a partir de novembro de 1705 há registo da atividade de população naquele lugar.
De difícil acesso, onde os caminhos empedrados e as estreitas ruas conduziam às 20 pequenas casas em pedra, sem água nem luz, era a agricultura a sua principal fonte de subsistência, não dando grande azo a muitas riquezas. Daí que a partida nos anos 60 acabaria por se tornar uma realidade.
Teotónia e Carlos Silva são açorianos, ela das Flores, ele da ilha do Pico. Ela funcionária da Sata, ele chefe das Finanças. Ambos a viver a dois quilómetros da Aldeia da Cuada e conhecendo o estado de degradação do local, decidiram que queriam adquirir uma das ruínas para as transformar numa casa de fim-de-semana ou de férias. Se bem o pensaram mais depressa o fizeram acabando por comprar também alguns terrenos à volta da propriedade, como conta ao Turisver Carlota Silva, gerente deste Turismo de Aldeia e uma das filhas do casal.


“Depois de os meus pais já terem comprado a casa apareceu por aqui um casal de alemães que andava à procura de um sítio para ficar e acabaram por alugar por vários meses a nossa casa, na altura sem luz nem telefone”, começa por explicar, acrescentando: “E foi durante esse tempo que aqui estiveram que foram elucidando os meus pais para o facto de poderem comprar mais ruínas na aldeia e transformá-las em Turismo Rural. Imagine há 36 anos nem se ouvia falar em turismo aqui nas Flores quanto mais em Turismo Rural.”
A ideia não lhes pareceu má de todo e embora não tivessem intenção de comprar a aldeia toda, foram comprando mais algumas casas e recuperando: “Os meus pais trabalhavam um verão para depois comprar mais uma ruína no ano seguinte”, recorda Carlota Silva, sublinhando que a traça original foi mantida, assim como o exterior que se transformou em pequenos jardins privados onde os hóspedes de cada habitação podem usufruir de momentos de lazer.
Bom, a verdade é que desde a aquisição da primeira casa à última, já este ano, passaram 36 anos e neste momento a Aldeia da Cuada tem 21 casas a contar “com a receção e os serviços externos”, como nos indica a filha do casal.
Carlota Silva estudou Nutrição e é também a mais nova das cinco filhas do casal. A pedido dos pais acabou por vir ajudá-los na gerência do Turismo de Aldeia. Com ela veio também o seu namorado, hoje seu marido e aqui ficaram.
Como se divide a Aldeia da Cuada
Todas as casas da aldeia têm os nomes dos seus antigos proprietários – Palheiro da Quinta, Casa da Luciana, Casa do Luis, Palheiro do Fagundes, Casa da Esméria, Palheiro do Pimentel Casa das Heras e Palheiro da Fátima são apenas alguns – e dividem-se entre T1 e T6. Existem oito casas T1, sete casas T2, um T4 e um T6.
Segundo Carlota Silva, o “T1 tem uma cozinha, um quarto com uma cama, uma casa de banho e uma zona de estar pequena e a zona exterior, e dá para alojar até duas pessoas. Enquanto o T6 tem uma cozinha, uma sala, quatro casas de banho e seis quartos, e pode alojar até 12 pessoas”.



Percorrer a Aldeia da Cuada é perder-se no tempo, num tempo que já não volta, em que a vida nem sempre era fácil, principalmente para quem vive isolado numa pequena ilha como a é a das Flores. Manter-se esse espírito de simplicidade e perseverar essa história, hábitos e costumes da aldeia foi o que pretendeu Teotónia Silva ao decorar cada uma das casas. O mobiliário foi restaurado e alguns dos objetos ali expostos adquiridos a vizinhos que já não lhe davam uso. Até as rendinhas, feitas pela sua sogra e por si dão o toque tão característico das casas das avós.
“As pessoas daqui sempre nutriram especial afeto por este projeto, que no fundo acaba por ter uma identidade do local e de quem aqui habitou. É lógico que também temos objetos mais modernos, como por exemplo as camas que são sommiers, mas as cabeceiras são antigas, ou seja tudo o que está à vista é uma recriação das casas da aldeia. Há pessoas que se querem desfazer de coisas antigas e vêm ter connosco para nos dar ou vender”, diz Carlota Silva.
As casas estão preparadas para que os hóspedes possam cozinhar, no entanto, a Aldeia, que se insere nas Casas Açorianas, tem um restaurante onde é servido o pequeno-almoço (que não está incluído na estadia), almoço e jantar. O espaço está aberto também a clientes externos, mas Carlota Silva alerta para o facto de ser necessário reservar previamente.

Quanto ao menu, não é muito extenso, porque segundo a gerente, o restaurante aposta nos produtos frescos locais. Ainda assim têm sempre três entradas diferentes, uma opção vegan, dois pratos de peixe e dois de carne.
Na Aldeia da Cuada é ainda possível fazer casamentos, batizados e retiros, no entanto, devido à procura é necessário marcar com bastante antecedência.
O que fazer nas Flores
Para alguns é considerada a ilha mais bonita do arquipélago açoriano. Ocupa uma área de 141,7 quilómetros quadrados e é constituída por terreno montanhoso, com grandes ravinas e falésias. Repartindo-se pelos concelhos de Santa Cruz e Lajes das Flores, a ilha tem pouco mais de 3.790 habitantes. Nós já lá estivemos e não podemos desmentir, embora acreditemos que cada ilha tem os seus encantos e segredos bem guardados.
Terminar o dia a observar “o último pôr do sol da Europa” é apenas um dos convites que a Aldeia da Cuada deixa aos seus hóspedes. Mas, para quem se quiser deslocar a apenas dois quilómetros dali encontra um dos cenários mais bonitos da ilha. Trata-se do Poço da Ribeira do Ferreiro que dá guarida a várias cascatas que caem de uma altura de 30 metros e embocam num lago tão verde quanto a montanha que nele se perfila.
Alguns dos trilhos mais bonitos da ilha têm início e fim na Aldeia da Cuada e para os mais aventureiros há ainda a possibilidade de fazerem uma viagem de barco até à ilha vizinha do Corvo, a mais pequena das nove, com pouco mais de 380 habitantes.
Fazer canyoning, tours de jipe, tours guiadas, birdwhatching, pesca e tours gastronómicas podem também ser algumas das opções para fazer nesta ilha que se enche de hortências azuis enquanto por ela passaemos.
Contactos:
Aldeia da Cuada
9960-070 Fajã Grande
Ilha das Flores, Açores
email: info@aldeiadacuada.com
telefone: +351 292 552 127 / +351 968 949 377
Preços: vão desde 85€ a 385€ / noite.